domingo, 29 de setembro de 2019

Só se vive uma vez




Eu sempre flertei com a insanidade.

Sempre foi meu mantra de sobrevivência.

A visão de um louco é com certeza a melhor armadura para o mundo.

E hoje não ia ser diferente de ontem.

Estava eu ali, de frente com aquele momento onde você percebe que vai enlouquecer.

E isso nunca foi um problema.

Eu estou sempre andando beirando o abismo por pura escolha.

Minha vida é feita de escolhas para o agora.

Eu acredito que já nasci com isso entranhado em mim.

Porém, existiram situações que talvez ajudaram nesse modo de pensar.

Lembro da minha época de colégio quando ainda era uma adolescente problemático.

O melhor aluno da sala tinha planos de ganhar uma viagem no campeonato de poesia.

Eu estava naquele campeonato por obrigação, não tinha o menor interesse nem no prêmio ou no destaque.

Pois bem, aquele ano desse aluno foi todo baseado em viver para isso e abrir mão do resto.

Um dia, em uma aula vaga que tivemos, todos nós fomos aproveitar e jogar um futebol na quadra.

Ele resolveu abrir mão daquele momento para focar na sua escrita, sozinho na sala.

Em algum momento ele teve um crise onde tentou vomitar, e por algum mau funcionamento do seu organismo, o liquido voltou para os seus pulmões.

Ele não resistiu.

E aquela situação, lembro que foi bem pesada para mim nesse questionamento sobre viver a vida.

Naquele ano, eu ganhei o campeonato de poesias no lugar dele.

Outro momento que fez eu filosofar bastante sobre como não deixar de fazer as coisas na vida, foi com Caroline.

Caroline era uma grande amiga.

Mas tinha um enorme problema, ela era focada demais para esse mundo.

E por isso, ela vivia o mundo dela.

Onde se resumia em estudar e trabalhar como louca para ter uma situação financeira segura mais rápido possível.

E com isso ela abdicava de viajar, de beber com os amigos e até mesmo de relacionamentos.

Morreu em um acidente bobo, do dia para noite com a conta cheia de dinheiro.

Com certeza esse foi um momento que abriu minha cabeça para esse tipo de reflexão.

Além de me gerar revolta.

Abriu meus olhos para ver como o mundo podia ser injusto.

Então hoje em dia, mais velho e mais experiente resolvi que vou viver minha vida como se fosse o ultimo dia.

Nada muito suicida de se fazer.

Mas vou aproveitar cada segundo.

Imagina eu, um velho escritor marginal.

Quase alcoólatra e degustador em outras épocas de qualquer tipo de substancia ilícita.

Um dia sentado como uma vegetariana, enquanto almoçamos juntos.

Ela me passa seu prato favorito de algo muito natural com ervilhas.

Eu dou uma bela abocanhada, e me engasgo com uma inocente e saudável ervilha.

Caixão e vela preta para aquele ser.

Morro ali, completamente roxo.

Seria uma piada horrorosa.

Essa imagem me passa na cabeça enquanto estou ali almoçando com a dona saúde que ando me encontrando.

Dou uma risada um pouco assustada e expulso esse sonho acordado.

Ela é uma vegetariana não religiosa.

Que quer dizer que segue sua alimentação sem aporrinhar as outras pessoas.

Eu me divirto me jogando de cabeça no seu mundo.

É gostoso a parte que você compartilha preferencias.

Cria laços.

Mas eu não queria mais aquele antepasto com ervilhas.

Ela tinha esse lado mais preocupado com o mundo, com a saúde.

Nada doentio.

Mas era com certeza um estilo de vida bem oposto ao meu.

Ela jogava o jogo e mergulhava no meu mundo também.
Eu vinha de uma maratona de pelo menos umas 3 semanas bebendo todos os dias.

Era um momento que eu estava com um vazio difícil de explicar.

E esse era um jeito de tentar preencher.

Ela me encontrava algumas vezes para compartilhar desse meu mundo.

Mas era muito centrada para ficar nele por muito tempo.

Nós tínhamos essa enorme diferença no momento que tinha tudo para nos afastar.

Alguns dias parecia que esse seria o caminho, outros, nos aproximava mais.

Terminamos de almoçar e estávamos ali trancados em casa por causa de um furacão que havia chegando na cidade.

La fora, rajadas de vento e uma chuva torrencial.

Ela saiu da mesa com um sorriso no rosto dizendo que desde sua adolescência não tomava banho de chuva.

Pegou a chave e foi para rua.
Fiquei ai congelado sem reação com minha cerveja na mão.

Da janela, conseguia ver que ela estava lá no meio daquele temporal pulando e cantando na rua.

Ela tinha um sorriso que conquistaria o mundo.

Uma leveza que ela transparecia.

Transbordava em um sentimento muito bom.

Ela olhou na direção da janela com o mesmo sorriso.

-Eu tenho esperando por uma eternidade você aqui, desce e vem aproveitar comigo essa sensação.
Só se vive uma vez.
- Ela parecia declamar uma poesia feita por anjos.

Sua energia era contagiante.
Eu parei por alguns segundos, dei um gole na minha cerveja e resolvi aproveitar aquele momento.

Amanhã talvez acordasse com uma pneumonia.

Por mais irresponsável que pareça, era assim que tomava as decisões recentes.

Eu penso no amanhã quando for a hora.

Eu não posso perder o agora.

Em segundos estava lá no meio do furacão que tinha nome de senhora, nos braços dela.

Aquele beijo no temporal teve uma energia muito grande.

E ela continua com aquele sorriso que me encantava cada segundo mais.

Ela vinha sendo uma coisa boa na minha vida.

Talvez o mundo dela colidindo com o meu, me desse um novo pensar.

Uma nova sensação.

Aquilo era tudo muito novo e tudo muito intenso.

Como uma nova droga.

Eu iria embarcar de coração aberto como sempre.

Ficamos ali por pelo menos uns 30 minutos.

Foi o suficiente para renovar totalmente as nossas energias.

A adrenalina daquela irresponsabilidade também foi um ótimo combustível.

Aquilo tudo criou um tesão incontrolável.

Ela me pegou pela mão nos tirando da rua e levando para o quintal da minha casa.
Me jogou naquela espécie de jardim com um pequeno gramado que era meu quintal.
Ela incendiava no meio daquele temporal.

Rasgou minha camisa como uma fera.

Me arranhava como se eu fosse sua presa indefesa.

Aquela era novamente a sensação de mundos se colidindo.

Aquela explosão de energia.
Nós aproveitamos cada segundo daquela experiência selvagem.

Voltamos para a casa em completa exaustão.

Deitamos no sofá e ela olhava nos meus olhos com aquele semblante leve e amoroso.

Como se não precisasse se preocupar com o amanhã.

- Meus dias com você é como viver uma vida selvagem 24 horas.
Quero sentir isso todos os dias. -
  e ela ficava ali me admirando.

Eu estava completamente hipnotizado pelo seu sorriso, seus olhos, sua energia e a troca que estávamos tendo.

Aquela sensação era para poucos.

E me deixava ainda mais certo de que minha filosofia era o meu melhor caminho.

Aproveitar o presente.

Viver a vida sabendo que ela é uma só.

Que todos seus erros e acertos serão extintos assim que o ponto final chegar.

Tudo será zerado e jogado no universo como poeira de estrelas que se apagaram.

Só se vive uma vez, e seria uma idiotice gastar a vida se lamentando ou mesmo se privando do agora em troca de um futuro que talvez nunca chegue.

Parece bem irresponsável minhas palavras.

Realmente é.

Nada ortodoxo.

Se você é um leitor meu, sabe bem que eu nunca fui um exemplo a ser seguido.

Sou só um criador de minhocas.

Planto elas na sua cabeça apenas para fazer você pensar sobre.

Melhor que isso, se questionar.

Sempre.

Esse é o caminho.

Suas decisões ,assim como as minhas, lidamos amanhã.

quinta-feira, 19 de setembro de 2019

Talvez amanhã um raio caia no mesmo lugar





“Tomorrow is tomorrow “ foi a frase de auto ajuda que um artista de rua vestido como Charles Chaplin resolveu dizer para mim quando passei por ele.
A intenção dele era um misto de artista de rua com uma espécie de psicologia para as pessoas.

Se ele te achasse triste, tentava te alegrar ou mesmo presenteava com flores.

No meu caso como ele mesmo disse, sentiu me ansioso.

-Esqueça o amanhã, viva o agora.
Amanhã é amanhã, outro dia, outra realidade. - Ele falava em um tom realmente que te fazia sentir confortável, além da sua ótima energia.

Ari estava andando comigo pela cidade e apenas achava graça.

Aquela frase fazia sentido.

Não para as pessoas ao meu redor.

Elas me achavam indestrutível.

Ari me via como uma Fortaleza.

Principalmente no quesito sorte com as mulheres.

Mas eu nunca criei essa imagem.

Eles que criavam e não havia explicação que mudasse esse dogma.

Eu era desajeitado e inseguro.

E com certeza perdia oportunidades apenas por congelar.

Recentemente tinha passado por isso.

Fui abordado por uma linda jovem que com olhos cinza claro e uma conversa com olhos nos olhos, e congelou completamente.

Eu em um primeiro momento fiquei hipnotizado, e em seguida totalmente sem reação.

Ela percebeu que eu travei e isso fez ela recuar levemente um pouco desnorteada.

Aquilo talvez tenha a constrangido mais do que a mim.

Olhos assim, usados desta forma me deixam com uma sensação de invasão total do meu interior.

E não a nada pior para mim do que me sentir invadido.

Mas nem toda batalha se ganha e eu já tinha amadurecimento suficiente para saber que tem dias que perdemos.

Ari não tinha essa maturidade sobre mim.

Eu contava a história e tentava explicar como perdi uma oportunidade de ouro daquelas.

Mas ele achava que era algum problema da menina.

O que era só uma forma de demonstrar uma insegurança masculina.

Naquele momento essa experiência passava na minha cabeça.

Eu realmente tinha fodido com tudo.

E não tinha volta.

O raio pode até cair duas vezes no mesmo lugar, mas no momento ele estava saturado da minha pessoa.

A jovem dos lindos olhos cinza claro tinha me dado a oportunidade de entrar no seu mundo.

E eu hesitei.

A porta se fechou.

Agora, tenho que aprender a lidar com essas merdas de uma forma melhor.

Recuar é sempre o melhor primeiro passo.

Respirar fundo e voltar a caminhada.

Passo por passo, dia por dia.

E o não martírio.

Esse é o ponto.

Se autoanalisar com critérios que não te joguem para baixo.

Dessa maneira você consegue coordenar todos os estragos.

Ela talvez quisesse mais do que eu poderia dar naquele momento.

E desculpas como essas, criadas para justificar as falhas, não ajudam.

Levante a cabeça, sorria e vá.

A probabilidade de encontrar ela novamente nessa cidade tão pequena, são enormes.

Então eu talvez tenha a chance de passar por esse constrangimento novamente.

E isso também faz parte da mentalidade correta.

Idade também é uma merda.

Você adquire essas habilidades com o tempo e com os erros.

E agora pensando bem, o Charlie Chaplin estava certo.

Amanhã é outro dia.

E quando chegar lá, nos preocupamos.

Se ela aparecer novamente amanhã, reagirei de uma forma completamente diferente.

Mas com certeza isso não é um planejamento.

Engraçado como uma frase pode mudar seu dia.

Estava realmente com uma ansiedade ácida.

E nem mesmo as boas sacadas de Ari conseguiram me fazer esquecer dela por um tempo.

E depois daquele simples momento de segundos, todo meu modo de pensar o dia mudou.

Talvez isso seja coisa de cérebro de escritor ou de pessoas loucas, mas tentei achar um sentido para aquilo.

Você vê o tempo todo as pessoas dessa forma nas ruas.

Pensando toda uma semana, um mês, um ano ou uma vida.

E isso vai ficando cada vez mais pesado e doentio de manejar.

E elas esquecem de viver aquele momento do presente.

Mesmo que seja algo prazeroso.

Você pode correr o quanto quiser, da forma mais veloz que puder, e mesmo assim nunca vai conseguir correr de você mesmo.

Então porque correr?

Porque pensar no amanhã quando você deveria estar ali desfrutando do agora.

Mesmo que seja algo um pouco irresponsável.

Mesmo que seja algo que tenha aquele gosto amargo de derrota.

E eu tinha sentido ele dias atrás.

Quando você joga esses sentimentos e pensamentos no papel, parecem loucuras jogadas ao vento.

Mas internamente sei o quanto ajuda no processo de fazer isso melhor uma próxima vez.

Como eu disse, o acúmulo de idade é uma merda, mas com ela vem a possibilidade de aprender alguns belos e eficientes truques.

Se você os ignora para continuar sendo um garotão de meia idade, você é só mais um idiota na massa.

Eu odeio idiotas.

Não escrevo para eles.

Eles não são afetados pelos meus textos.

Falamos em uma frequência diferente.

Algo que me deixa muito orgulhoso.

Ari estava um pouco preocupado com meu humor recente.

Mesmo bastante ansioso por esses dias, eu não andava no meu mau humor peculiar.

Ele havia me convidado para uma caminhada e eu não havia feito nenhum tipo de reclamação, isso não era habitual para ele.

Ari iria para Itália ficar um mês, já que tinha achado uma pista do seu irmão desaparecido.

Ele andava bastante estressado e ansioso com essa questão por esses dias.

-Acho que devemos sentar no bar e descarregar toda essa carga negativa Ari.
- Diferente de todas as vezes, dessa vez eu dava o primeiro passo para fazer algo.

-Não acho uma boa ideia, meu voo é amanhã cedo.
- Ele respondia receoso e desanimado.

As pessoas vivem no 220v,24 horas por dia e nem ao menos percebem.

Nós estávamos ali em uma caminhada tendo exatamente uma conversa sobre como aproveitar o momento e deixar um pouco o amanhã de lado.

Seus movimentos robóticos já levam a resposta e ações automáticas.

E com meu novo lema e insistência, minutos depois estávamos no bar bebendo como se não houvesse amanhã.

Mas meu real sentimento era de que amanhã era só amanhã.

E mais profundo, mesmo sem querer pensar muito nisso, eu só torcia para que aquele raio de olhos cinza claro caísse no mesmo lugar mais uma vez.

E dessa vez eu estaria de peito aberto para não decepciona-la.

Ele já estava mais leve depois de alguns minutos bebendo, e seu sorriso característico já havia voltado.

Peguei minha cerveja e brindei com uma gargalhada

-Tomorrow is tomorrow bitch.