Finalmente Faith estava de volta a minha vida, mesmo que temporariamente.
Chegou com aquele pé na porta como sempre e eu amava ter ela ao meu lado novamente.
Bali agora brilhava diferente.
Faith era uma das poucas que conseguia me acessar e me entender.
Era como se fossemos irmãos de alma.
Nos tínhamos uma vila inteira, com uma piscina de borda infinita de frente para o mar.
Eu não me ligava a dinheiro, porque hoje em dia Ari não deixava eu pagar por nada mais, muito menos com Faith.
Mas posso garantir que aquilo não era tão caro quanto parecia, não em Bali.
Eu tinha feito os sanduíches que ela tanto amava, e ela complementava com seu ritual de paz, que adicionaria cerveja e Ramones de fundo.
Já passei tantas vezes por esse ritual e assisti ela tão leve, que até me fazia bem hoje em dia.
Mas ela estava irritada comigo por algo, e sabia que ela não ia deixar de externar.
- Porque você esta tentando se esconder do mundo de novo - Ela dizia sem cerimônia olhando fixamente para os meus olhos.
E eu negava dando um gole na minha cerveja e sorrindo.
Falei com a Gato preto, e parece que ela estava decidida a vir para Bali e você cortou ela.
Você também não está tentando afastar ela? - A ironia de Faith conseguia ser pior que a minha.
Pela primeira vez estava assistindo Faith fazendo lobby para alguém ficar comigo.
Mas Faith sempre foi a minha melhor amiga, porque sempre entendeu os meus motivos.
E la foi eu, tirar ela dessa trilha louca que ela queria trilhar.
Um pouco antes de eu começar meu ano sabático, eu reencontrei a Gato preto na minha cidade pela vigésima vez.
Ela sempre ficava pelo mundo, ai após 1,2 anos, voltava uns meses para Limerick.
A gente se envolvia e sempre parecia que talvez fosse a hora de isso virar algo a mais.
E assim que ela sentia isso, ela corria.
Antes eu achava essa liberdade dela apaixonante, mas com o passar dos anos e a convivência, percebi que era apenas medo.
O medo vinha, e ela fugia, mas colocava um papel de parede lindo de liberdade.
E isso nunca foi um problema para mim.
Até ser.
Do momento que ela começou a tentar entrar na minha vida.
Aquilo não era certo.
Era cercado de joguinhos que não cabiam mais.
Não existia uma atenção verdadeira.
Parecia uma peça de teatro, uma encenação.
E ela não se livrava do passado.
Parecia ter uma esperança que aquilo voltasse a vida.
E isso me matava.
Foi me matando aos poucos.
Até o ponto que meus olhos não brilhavam mais com ela.
Às vezes você vai se machucar por escolha própria.
Mas eu aprendi com a vida a saber estar em pedaços, sem machucar ninguém com os cacos.
Ela não parecia ter essa noção e isso me afastava mais dela.
A minha despedida dela foi a fatídica festa de Halloween.
Menina da neve estava la.
Meu doce pecado também.
A guitarrista me cercava e minha vizinha e Faith entraram em uma estação completamente errada nesse dia.
Então eu consegui ser diferente do Vigário do passado, e focar na minha saúde mental e nos meus sentimentos.
É engraçado ler eu escrevendo sobre meus sentimentos abertamente.
Parece que finalmente eu amadureci, ou apenas envelheci.
Não participo mais dos jogos, pelo contrário, pego ranço hoje em dia.
Resolvo tudo conversando e jogando limpo.
Me deixando ser vulnerável.
O que eu condenaria muito no passado.
Mas cheguei a um ponto onde entendo, que se alguém se aproveita quando você baixa suas defesas para ela entrar, o problema não é você.
Empatia continua sendo meu mantra
Não me alimento mais de arrependimentos.
E minha tatuagem continua dizendo a primeira regra.
Não tente.
Se não for mergulhar de cabeça, não tente.
Se não estiver disposto a dar All in, não sente na mesa.
O passado fica no passado, só trazemos as lições de la.
Porque o passado é como um gás venenoso que fica agarrado em você e envenenando todos a sua volta.
Enquanto você não se livra disso, só vai machucar os outros.
Eu podia vir aqui e usar a desculpa de que estou ferido e trazendo os traumas do meu passado com a Mafiosa.
Muitos a minha volta parecem me dar esse salvo-conduto.
Mas depois que você entende quem você é e reafirma seu caráter e o que você quer para sua vida, no meu caso, isso, não cabe mais essas situações.
Então resolvi não mais me relacionar com Gato preto, nem mesmo por diversão como nos velhos tempos.
Mesmo com a licença poética que ela adora usar, de somos livres.
Essa falsa liberdade já encheu meu saco.
Faith olhava para mim com aquele olhar de admiração que ela me jogava em vez enquanto.
Parece que minha explicação tinha sido aceita.
- Nossa, Vigário, quem diria que o cara que despedaçava corações por aí com a desculpa de estar cheio de traumas e cicatrizes, iria virar alguém preocupado com responsabilidade afetiva. - Ela batia palmas com um pouco de verdade e muita ironia ao mesmo tempo, enquanto era pega no seu ato falho e gargalhava.
Mudei bastante desde aquele fundo do poço que narrei aqui por anos.
Já fiz muito mal aos outros.
Mafiosa foi um sintoma de uma doença que eu estava virando.
Não justifica os atos dela, mas também não justifica os meus.
Cansei de relacionamentos de fachada.
Que a pessoa se esconde.
Te machuca pelo simples sentimento falso de ganhar um ponto defendido.
Ficar pisando em ovos.
Relacionamento onde devido às minhas merdas, eu colocava a pessoa como se fosse em uma camisa de força.
Isso sufoca, isso mata.
E eu já estive nessa posição horrorosa de sufocar alguém.
Não vou mais repetir isso.
E pretendo não mais participar disso.
Então a Gato preto não foi pega de surpresa.
Deixei bem claro para ela mergulhar de cabeça ou nem vir para a piscina.
Mas ela achou que o antigo Vigário continuaria encantado com seus belos olhos e seria distraído por mais alguns anos.
Não mais.
Enquanto Faith fazia seu showzinho dançando com uma cerveja na mão, dando suas gargalhadas e batendo palmas para mim, eu apenas sorria.
E meu sorriso foi crescendo e ela percebeu que tinha algo diferente nele.
Atrás dela, os seus sanduíches eram roubados por uma gangue de macacos de Bali.
Eu assistia aquela cena como se estivesse em um cinema de tela gigante.
Estava apaixonado por Bali e pela minha vida novamente.
Faith resolveu que ia ficar comigo no meu sabático até eu dizer que não queria mais.
Então parecia que a Ásia ia tremer pelos próximos meses.
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