quinta-feira, 19 de dezembro de 2024

Nunca minta para um mentiroso

 




Eu era um escritor e com isso ganhava dinheiro com mentiras.

Mentir era um dom, que me deu todo o meu pequeno império, ou seja, minha carreira.


E por causa desse meu dom, eu tive que me especializar em tudo que uma mentira gerava.


Eu era ótimo em identificar mentirosos.


Até mesmo os que acreditavam na sua própria mentira.


E la vinha mais uma mentira.


Eu estava em uma semana de bastante trabalho.


Sentia uma ansiedade novamente forte como não sentia em muito tempo.


Também era mês de dezembro, um mês chato e que me incomodava todos os anos.


Dezembro as pessoas se colocam em uma posição onde não existem energias ruins.


Todo tom de falsidade e sorrisos, que nem mesmo um abraço no seu inimigo ao lado é um problema.


Tirando os religiosos e as crianças, o resto esta vestindo as roupas de um mentiroso por um tempo.


Mas não vim aqui ser o estraga vibe de natal.


Naquela manhã, após ouvir da Maeve que ela estava muito orgulhosa de eu ter voltado a produzir como nos velhos tempos, ela me pedia para descansar.


Eu estava me sentindo estafado e devido à ansiedade latente, eu parecia não perceber que estava perto de um colapso.


Mas ela percebeu.


E como minha agente de tantos anos, me obrigou a parar uns dias.


Agradeci e resolvi apenas finalizar meus emails para então tentar descansar minha mente.


E la estava um email que me tirava um sorriso sem ao menos ser aberto.

Assunto: Ao rei canguru que declinou do seu trono.


E eu já sabia que era um email da minha Aussie girl.


O email começava com sua última mensagem depois da nossa despedida.


“Você nunca vai encontrar a mesma pessoa duas vezes, nem mesmo na mesma pessoa…

Não sinto sua falta, mas espero que você esteja bem.

Lembrei de você lendo seus últimos contos que se tornaram bastante popular aqui na Austrália depois que você escreveu sobre uma musa australiana.

Aqui, aparentemente te deram o título de rei dos cangurus, mesmo sem você ter desafiado um canguru macho alfa de uma trupe.

Ouvi uma espécie de história feita em podcast, como um audiobook, que parece ter o espirito da sua escrita.

Te indicar parecia ser o certo a se fazer.

Espero que aproveite e lembre de mim de alguma forma.

Hooroo”

Ela se despedia com seu tradicional tchau australiano e deixava um link para a história que ela citava na mensagem.

Eu podia reconhecer todas as palavras que ela escolheu a dedo para encobrir seu real interesse em me mandar a mensagem.

Meu cérebro funcionava assim, sempre lendo nas entrelinhas esses movimentos sobre uma pessoa que estava sendo verdadeira ou não.

Ela já começava o texto brincando com uma pequena mentira, “não sinto sua falta”, exatamente como foi a mentira da nossa despedida, “não iremos nos falar mais” e dias depois eu recebia uma mensagem.

Existe mentiras que você cria para um jogo social e existe mentiras que vão moldando seu caráter.

As mentiras que moldam seu caráter são as que vão te definir para o futuro, não importa se você tem um sorriso bonito e engana dois ou três.

Com o tempo alguém vai te ler, assim como eu tenho bastante facilidade com essa leitura e seu personagem será jogado no limbo.

E não pense que você vai ficar sozinho.

Esse é o maior engano e a ameaça mais errada que as pessoas fazem a um mentiroso.

Vão ficar do seu lado pessoas que irão usar sua fraqueza para proveito próprio.

Quando você perceber, sua vida já vai ter sido direcionada por um monte de mentirosos feito você foi.

Mas quem sou eu para falar mal de mentiras aqui.

Eu vejo a mentira como uma arte.

Estudei não só para escrever mentiras, como nos meus tempos de investigador particular com John, famoso Kozlowski naquela época, fizemos cursos de psicologia criminal para ajudar nos nossos casos.

Bem verdade que toda essa especialização me ajudou mais a ler um mentiroso do que a procurar uma amante de algum marido infiel que era o padrão dos nossos clientes na época.

Mais aprendemos bastante, principalmente a identificar mudanças na postura corpora e ver aspectos que a mentira se mostrava na pessoal, como mudanças no tom de voz, respiração e recursos linguísticos.

Resolvi então tomar um banho quente e coloquei aquela serie que tinha vários episódios para tocar.

E parece que fui engolido para outra dimensão.

Eu comecei a comer aquilo dia e noite.

Era uma rede de mentiras e reviravoltas que me deixavam excitados e me traziam vários sentimentos diferentes.

Uma das personagens principais tinha uma voz que me lembrava de uma personagem que eu tinha uma paixão platônica quando era adolescente.

E aquilo me dava uma sensação que me prendia mais ainda.

Por alguns dias eu criei a rotina para continuar ouvindo aquela historia.

Que era dividido em 4 momentos do dia.

Fazer uma caminhada de manhã.

Tomar um longo banho quente.

Fazer alguma receita para uma refeição.

E quando fosse dormir deixar tocar.

Essa ultima era a mais doida.

No dia seguinte eu voltava da onde minha memória me dizia que eu podia ter ouvido antes de dormir.

Mas aquela historia continuava enquanto eu dormia, e como por osmose influenciava nos meus sonhos.

E eu estava fascinado pelo mundo que estava de frente.

A história era atraente, os personagens te prendiam e faziam você se importa, além da forma de se comunicar e contar uma história que para mim era completamente nova.

Não existe uma forma de se comunicar absoluta, existe é a comunicação.

Depois de morar fora, convivendo com outra língua, você percebe que se comunicar é o que importa e não como.

Aqui você pode se limitar.

Quando não se abre para esse mundo enorme de formas de se comunicar.

De linguagens, de culturas e de pessoas.

Algumas pessoas percebem que suas mentiras só funcionam em um grupo, então se fecham neles e se sentem desconfortáveis em outros grupos.

Até nisso a mentira tem um padrão.

Eu ainda não terminei a história.

Já me peguei sendo enganado algumas vezes na história, e resolvi escrever antes de qualquer frustração de um capítulo final da obra.

Capítulos finais são o problema de qualquer história, então a preparação é sempre bem-vinda.

Deve ser por isso que não gosto de finais nos meus contos.

Sempre deixo em aberto, até mesmo porque na arte da mentira o ideal é deixar que a pessoa que esta sendo enganada complete algumas lacunas.

E aí você consegue criar uma mentira perfeita.

É fácil.

Faça o teste do vigário.

Coloque uma roupa bonita, faça seu passo a passo normal como se fosse sair, sorria em frente ao espelho e pergunte em voz alta.

Qual é a mentira perfeita?

Sua resposta virá.

sábado, 23 de novembro de 2024

Um longo dia das bruxas

 




Memorias afetivas eram um problema que eu tinha.

Fosse elas positivas ou negativas.


Não gostava de ser teletransportado para o passado.


O passado era algo que eu tentava manter enterrado.


Parecia ser a minha fase mais saudável, depois que decidi parar de remoer coisas que já tinham acontecido.

Mas sei la, o passado sempre dava um jeito de sorrir para mim e isso me dava uma pequena desestabilizada.


Porem, nada de mais também.


Vigário não tinha deixado de ser uma rocha para uma folha de isopor da noite para o dia.

Eu tenho dois exemplos clássicos, que mostram como memorias afetivas me pegam de verdade.


Lembro até hoje do cheiro da menina do meu primeiro beijo.


E não tem romantismo nisso.

Eu mal lembro da menina em si, apenas do perfume.


Se esse cheiro aparece em algum lugar que eu esteja, eu sou levado para sensações daquele momento.


E isso me deixa maluco.

Porque sinto que até meu espirito se molda aquela memoria.


Me sinto um adolescente novamente, mesmo no auge dos meus 30 e poucos anos.


O cheiro é muito bom, tenho que admitir, mas não saberia descrever.


Meu segundo grande problema com memória afetiva é em relação à sensação de câmera lenta.


Esse me dá uns gatilhos mais perigosos.


Eu não sei que tipo de trauma que eu carrego em relação a essa sensação.


Mas hoje em dia, se paro para ouvir alguém muito calmo, com tranquilidade na fala, eu começo uma mini crise de ansiedade


Volta aquela sensação como se todo meu mundo estivesse em câmera lenta, e eu só quero sair de la e não consigo.


Eu refletia sobre essas memórias tomando um vinho na janela enquanto assistia nevar la fora.


Pessoas fantasiadas lotavam a cidade, já que era noite de Halloween.


Para um cara que odiava o clima natalino como eu, a temporada de dia das bruxas era um respiro.


Faith aparecia na minha porta com um sorriso no rosto que era fácil de identificar o porquê.


O sorriso que anunciava o caos.


- Temos visita - Ela anunciava.


E antes de qualquer outra palavra, la estava ao seu lado, o caos antes anunciado por sinais.


A Gato preto, A ladra de corações.


Com aquela aura de liberdade que dominava o ambiente que ela chegava, vinha com um convite já aceito anteriormente por Faith.


- Nos vamos para uma festa de Halloween agora, se arrume. - Falava jogando uma sacola com uma fantasia na minha direção.

Aquilo parecia uma piada de mau gosto.


A gato preto estava em uma temporada na Irlanda, descansando antes de voltar para o mundo.


A vitima do momento que ela tentava roubar o coração, era eu.


Em minutos, Faith já estava vestida de diaba e a Gato negro com uma fantasia de cigana.


Cigana também era um dos apelidos que eu gostava de chama la, pois roubava um coração e ia para a próxima cidade.


Minha fantasia era de vampiro, bem simples.


Elas sabiam e já tinham planejado isso anteriormente, que se fosse algo muito chamativo, eu não iria.


Pois bem, la estava eu em uma experiência social que eu, por livre espontânea vontade, jamais optaria por fazer.


Eu sempre soube ler as expressões de Faith, e algo na falta de informação dela sobre a festa e algumas linhas faciais me diziam que eu teria problema.


No meio do caminho fui sendo informado lentamente sobre a festa e minha paz de espírito foi se despedindo.


John e a turca do ácido já estavam la a minha espera, com um convidado especial.


Latini.


Não existe pessoa melhor para ser o caos encarnado.


A festa era de um desconhecido, que estava muito feliz em me receber, mesmo eu não sabendo da festa até então.


E em algum momento Faith me avisava que a festa era um pouco além do que eu podia esperar, ainda falando que eu iria me sentir em um labirinto.


Dei de ombro com aquelas informações codificadas, que não faziam sentido até então.


Chegando na festa, a porta se abria e aquela noite já começava a se mostrar com o potencial que teria.


Na recepção, a Francesa com sua roupa de unicórnio de sempre, nos recebia com um grande sorriso e um abraço longo.


Eu não a via fazia um bom tempo e tirando que ela era insana, eu sempre me dei muito bem com ela.


Ao lado dela, o dono da casa, que parecia emocionado com minha presença enquanto eu o cumprimentava constrangido.


Odiava essa vibe popular que me seguia devido à minha carreira, mas eu sempre soube disfarçar bem para não ser um babaca.


O dono da casa apertava minha mão de uma forma nervosa, sem largar e meio que suando.


Ele realmente parecia estar nervoso na sua fantasia de pirata tão genérica quanto a minha de vampiro.


Um beijo no pescoço me tirava daquela situação constrangedora e me colocava em outra.


Memorias.


Sempre elas, e mesmo que não fizesse sentido, eu reconhecia aquele gesto.


La estava ela, a Guitarrista.


- Segunda vez no ano que nos encontramos, já podemos casar. - Ela se divertia.


Sua fantasia era uma espécie de menina punk inglesa.


Enquanto ela me abraçava, apontava para uma direção que mesmo com minha miopia,eu conseguia identificar aquela imagem.


O Rockstar, vestido de rockstar mesmo e parecia que ninguém o reconhecia.


E Latini, vestido de Diabo, para desespero de Faith.

Latini vinha me abraçar já com seu astral afetado, e por toda sua fantasia ser vermelha, foi bem fácil de identificar os pontos brancos que me diziam que ele já tinha começado sua festinha.


A Gato negro me pegou por um braço e Faith pelo outro e me levaram para dentro da festa, porque diziam que tinham mais pessoas esperando por mim.


Identifiquei Ari, Elliot e John de costas em um grupo grande de pessoas.


Ari estava de imperador romano, com muito ouro de verdade na sua fantasia, e ele estava acompanhado de uma modelo eslovaca que se vestia de alguma divindade.


Era difícil de explicar toda aquela beleza.


- É Faith, parece que o inferno não vai se criar aqui hoje - Eu soltava meus comentários idiotas, que eram automaticamente seguidos de um socão de Faith no meu ombro sofrido.

Essa coisa mal resolvida de Faith e Ari estava sempre no ar.

Elliot estava vestido de algum personagem de anime, que eu não iria reconhecer, com sua namorada, a cigana romena do Circo.

Depois daquele primeiro encontro, eles conseguiram se reencontrar e começaram um relacionamento.

John e a Turca do ácido estavam vestidos como hippies do Woodstock.

- Você precisa ver a terceira hippie dessa festa - Dizia a Turca, puxando um braço.

Eis que me aparece a reencarnação da Janis Joplin, vestida como a própria.


E enquanto eu ainda tentava recuperar o folego, uma mulher vestida de cupido pulava em cima de mim e outra duas vinham sorridente ao meu encontro.


Maeve, a Loba de Wall Street e a Maria Madalena de Hollywood também estavam la.

A loba se vestia de bruxa.


Maria Madalena, parecia estar exatamente como seu personagem era no seu filme de sucesso.


Maeve na sua versão cupido, parecia uma piada bem pensada, se pensarmos no nosso passado.


No canto, a minha vizinha estava vestida de gêmeas do filme Iluminado.


Aquela também parecia ser uma fantasia pensada, nesse caso como uma homenagem a sua irmã.


Ela fez um sinal meio seco de longe, mais por educação do que por vontade.


Desde minha volta, o clima nunca mais foi o mesmo entre a gente.


Aquela festa era uma overdose de informação.


Para onde eu olhasse, eu via conhecidos e tambem via problemas.


Sempre que me sentia desconfortável, olhava em volta e estava sendo encarado por alguém.

E um momento, senti essa sensação e quando olhei, na minha direita me encarava a doce pecado e na minha esquerda me encarava a menina da neve.


Aquilo parecia um pesadelo.


Ali caiu minha ficha sobre o labirinto que Faith falou no caminho para a festa.


Meus três minotauros se reuniram no mesmo lugar e eu não tinha nem uma fantasia decente que me escondesse.


Tive meu momento de atenção com todas, mesmo que de forma rápida, pois sentia que tinha uma competição no ar.


Faith era meu porto seguro.


Ela também parecia estar meio desconfortável.


Não era normal Ari aparecer acompanhando em algum lugar que Faith estivesse, então aquilo parecia ser um sinal de um relacionamento mais serio.


A guitarrista se aproximou de nos dois e disse que estávamos com um semblante de desconforto e que a Turca tinha mandado entregar algo para a gente.


A Turca iria honrar seu nome até o final, e o presente dela nada mais era do que um acido para mim e Faith.


Enquanto a guitarrista cortava em 4 pedaços, Maeve,minha cupido aparecia sorrindo e pegando um pedaço para ela. 


Colocava outro na minha língua e um na língua de Faith, enquanto a guitarrista tomava o último como um pacto.


Aquilo parecia ser muito necessário naquela situação.


Acho que depois de um tempo eu e Faith desencanamos.


A festa estava uma loucura.


A maioria das pessoas estavam insanas.


Latini e o Rockstar cheiravam cocaína nos peitos de algumas mulheres que nunca tinha visto.


De longe, Latini abria um sorriso e me convidava a participar.


Prontamente, eu movia minha cabeça negativamente para ele.


- Não trouxe seu casaco de novo para a trilha Vigário? - A guitarrista me questionava gargalhando.


Essa era sempre minha resposta para fugir da cocaína.

Eu achava cocaína uma das vibes mais baixo astral que existia, e não tinha nenhum interesse de ir para esses lados.


Elliot e a cigana estavam em clima de romance total, e eu estava orgulhoso de ver o que Elliot tinha se transformado.


Ari e a super modelo, estavam bem reservados aproveitando a festa de forma tranquila.


Minha vizinha pareceu abandonar a festa, logo depois que minha presença não foi mais suportável para ela.


Maria Madalena, a Loba e Janis estavam se divertindo juntas como nunca.


- Vigário, hoje nos temos uma surpresa para você depois da festa. - As três falavam com planos diabólicos.

A Gato preto passava mal no banheiro enquanto, como uma ironia do destino, a Menina da neve segurava seu cabelo.


Meu Doce pecado falou por um tempo comigo, mas disse que não se sentia bem e também abandonou a festa mais cedo do que o esperado.


Era muitas pessoas para dar atenção, ou para tentar ignorar com carinho.


O anfitrião também aparecia do nada, com seu sorriso nervoso e uma piada sem graça para puxar assunto.


Nessas horas minha fantasia podia ter o modo morcego e me tirar dali voando.


Mas eu sorria sem graça tentando ser o menos babaca possível.


Aquele Halloween parecia uma sexta-feira 13.


Em algum momento aquele acido especial da Turca, bateu.


E fui levado para uma dimensão mais confortável.


Já andava pela festa mais seguro.


Indo ao banheiro senti aquela sensação, que pensava sobre no início da noite.


Aquele perfume, que era minha maior memória afetiva.


- Seria muito absurdo eu te pedir um autógrafo? - Uma mulher vestida de Cleópatra me perguntava meio sem jeito.

- Não tenho papel, nem caneta e nem acho que conseguiria escrever algo nessa altura do campeonato - Eu respondia sem nenhuma improvisação na desculpa.

Enquanto ela sorria, dizendo que também não tinha e como um raio, me beijava sem cerimônia.

Para mim, pareceu um beijo demorado, e tenho que admitir que estava curtindo.

Porque mesmo sem ter ideia de quem era aquela Cleópatra, eu estava sentindo aquele momento novamente, do meu primeiro beijo.

E pensar isso, me soava idiota e, ao mesmo tempo, engraçado.

Da mesma forma que me beijou sem muita fala, saiu com um sorriso.

A guitarrista veio ao meu encontro e se divertia com aquela cena.

Botou mais alguma coisa na minha língua e falou que dali em diante, eu era responsabilidade dela.

E dai em diante, só tenho flashes.

O meu teor alcoólico com a guitarrista aumentou consideravelmente, já que a gente sempre que se via, se jogava na tequila.


E claro, ela estava me colocando aditivos.


A música soava diferente.


Me relaxava.


Eu sempre estava com alguma das meninas na minha volta, e a guitarrista sempre do lado.


Foi uma noite interessante.


Mas perdi o controle como não fazia há tempos.


O meu Halloween parecia interminável.


Essa foi a primeira coisa que veio na minha cabeça, quando senti aquela secura na boca.


A cabeça ainda rodava e senti meu corpo meio sem espaço.


Eu conhecia aquela sensação.


A parte da secura e a cabeça rodando não era tão preocupante.


Mas a falta de espaço sim.


Tinha dormido com alguém.


Respirei fundo e resolvi encarar aquela situação.


Minhas apostas eram a guitarrista.


Mas parece que eu teria que começar uma investigação para entender aquilo.


Minhas primeiras imagens foram ver roupas espalhadas pelo quarto.


Na cama ao meu lado, estavam Faith e minha vizinha.


Eu não dormia com Faith e estava morto para a minha vizinha.


Ela, por sinal, tinha ido embora cedo da festa.


Aquela não era minha cama, mas eu reconhecia o quarto.


E isso só piorava a história.

Eu estava no apartamento de cima do meu, logo, na cama da vizinha.


Antes que eu conseguisse reagir e correr daquela situação, as duas abriram os olhos com o mesmo tom de surpresa no ar.


Parece que o dia das bruxas iria se arrastar por um tempo.

sexta-feira, 15 de novembro de 2024

O último amor é sempre o mais forte

 



Eu podia analisar vários dos meus relacionamentos.

Ficaria aqui falando por horas.

Fiz esse exercício mental no banho.


Acho que queria encontrar o amor perdido em um dos antigos.


Ou mesmo tentar entender o perfil do relacionamento do futuro.


A Bailarina era bem blasé, mas nesse sentido de amores, já tivemos uma conversa.


E ela era taxativa.


Seu maior amor será sempre o atual, ou seja, o último.


Se não for assim, você esta fazendo algo errado.


Quando a imagem do seu relacionamento for diferente disso, você já sabe que começou um relacionamento da forma errada.


Talvez devido a uma decepção amorosa e o desespero em se demostrar superior.


Carência pode ser o motivo.


Ou simplesmente você foi viver o momento e se equivocou.


Quem nunca?

Viver o momento é um dos meus maiores pecados.


Isso pode trazer grandes paixões, facilmente confundidas com amores.


Naquela conversa, a bailarina tinha de fundo aquela cantora que ela sempre ouvia, da voz adocicada e quase infantil, com seu piano ditando as batidas da música.


Eu não conseguia desassociar meus pensamentos e memorias sobre aquilo sem seguir esse ritmo e aquela voz na minha cabeça.


Imagino que ela falava de amor.


Talvez ate mesmo de decepção.


Eu conseguia sentir uma tristeza escondida na sua voz.


Às vezes tenho saudade dos meus impulsos.


Até mesmo saudades dos impulsos ignorados.

Você ama até não amar mais.


Parece injusto, mas é a maior justiça que existe.


Difícil seria continuar amando sem amor.


E assim, como aquela música de palavras doces que sempre acompanhavam a Bailarina, o amor tem dessa melodia.


Recentemente eu uso fones de ouvidos com outras melodias o mais alto possível para não ouvir esse tipo de canção.

Os corações que você tocar, serão marcados para sempre.


A bailarina com certeza não era meu maior amor, estava bem longe na real.


Mas ela foi uma experiência boa.


A melhor parte do caminho são as experiências e não o destino a ser alcançado.


A carga disso, poucos conseguem lidar de forma madura.


E por isso de tantos relacionamentos fracassados.


Eu tive relacionamentos de meses que me colocaram no monte Olimpo e relacionamentos de anos que me levaram direto para o inferno de Hades.


Uns me ensinaram sentimentos nobres, outros me envenenaram um pouco mais para o próximo.


Eu to longe de ser um especialista do amor.


Garrafas vazias e cura de ressaca era mais minha especialidade.


Eu sempre fui do tipo que tem várias paixões e aí minha inabilidade com o amor.


Paixão queima de uma forma, que vira sua cabeça do averso e dai só muita prática para não se deixar ser enganado.


O efeito era como de uma droga, que te dava o êxtase e depois te trazia de volta a realidade.


O amor estava mais para o alcoolismo.


Se você se desconecta da pessoa de uma hora para outra, nunca foi amor.


Só paixão.


Não importa quanto tempo durou, a dosagem da droga só foi maior.


E com isso muito mais danos.


Sorria no alto do penhasco.


Assim será sua vida até o próximo amor.


O que promete ser o maior de todos.


Recuse se a voltar para amores antigos.


Eles vem envenenados.


Com uma carga enorme de ansiedade e pressão para um resultado diferente.


Depois que duas almas se afastam, é um caminho sem volta.


Por isso que o mundo tem bilhões de pessoas.


Para assistir você cometer novos erros.


E não repetir os mesmos, como um jovem triste e sem perspectiva.


Um pé na bunda pode ser o impulso que você precisa para fazer diferente.


Para mudar sua visão de mundo.


A carga emocional é grande, mas vale a pena.


Eu já fui um viciado nesses sentimentos.


Viciado no sentimento de término, de paixão e mesmo de amores sinceros.


Bons tempos que eu tinha saúde mental para isso.


Tesão não se aplica aqui.


Não seja um adolescente tardio e confunda tudo que foi dito com hormônios.


Sexo de amigos ou algum desafio pessoal para alimentar o ego.


Nesse texto existe alguns dos princípios básicos da complexidade de um amor ou não amor.


Esqueça seu orgulho.


Não só no amor, mas como na vida adulta no geral, o orgulho não cabe mais.


Você já deveria ter aprendido isso.


Se afaste de tudo que te limite e você conseguirá sentir realmente o sentimento.


Mas nunca se esqueça, corações curiosos sofrem as maiores quedas.


Depois de alguns relacionamentos que considero saudáveis e outros fracassados, consigo ver algum sentido na tese da Bailarina.


Meu último amor era de longe o mais forte, e o amor do momento era eu mesmo.

domingo, 13 de outubro de 2024

Mais uma corrida de cavalo


 



Ficar sentado com Faith sempre me fazia bem.

Ela consegue acessar algo além e me trazer de volta para uma frequência onde eu me sinta melhor.

Hoje eu precisava disso.

Eu parecia um rádio velho, que não sintonizava de jeito nenhum.

Na minha cabeça, apenas chiados o dia todo.

E aquilo me causava uma irritação e, ao mesmo tempo, aumentava a minha ansiedade e pensamentos em exagero.

Quando chego nesse lugar, a única que conseguia me resgatar era ela.

Eu e Faith tínhamos uma amizade com limites acordados.

O mais importante deles, era não ter nenhum envolvimento sexual.

Ela sempre torceu o nariz para isso, mas conseguia entender o porquê eu tinha criado aquela regra.

Ari era como um irmão, e Faith o amor da sua vida, mesmo que não correspondido.

Era muito fácil se apaixonar por Faith, ela era uma mulher que você iria querer ao seu lado.

Não era aquela coisa desrespeitosa como a nova geração fala, da friendzone, onde você fica brincando com aquele sentimento que esta no ar.

Onde um dos lados percebe, e se aproveita disso para inflar o próprio ego, em um jogo meio infantil até.

Alimenta algo e depois recua.

Nos não tínhamos esse problema e com esses limites impostos, eu conseguia me abrir mais com ela.

Por esse motivo, Faith era minha oraculo, minha analista e minha bússola.

Segundo ela, eu não era mais um cigano de corações como antigamente. 

Eu parecia estar me limitando recentemente, na real estava fugindo de qualquer coisa que fosse padrão.

Precisava de algo que virasse meu mundo de cabeça para baixo.

Eu era viciado nesse sentimento.

- Eu espero que você se cure das coisas que você não fala sobre - Faith dizia com um sorriso carinhoso.

Não sabia o porquê daqueles dias ruins constantes que eu acordava como hoje, com a cabeça cheia e o coração apertado.

Eu ensaiava uma despedida em breve, onde eu viraria as costas para tudo e todos de Limerick em silêncio, e iria para o mundo.

Mesmo para Faith e os outros, esse tom de despedida já estava no ar, e Faith tinha entrado no modo atenção total a mim.

Quando eu fizer 80 anos, eu estarei lembrando dos meus melhores dias do passado, que são os dias de hoje, o agora.

E eu tento não perder isso de vista.

Eu quero, mas não preciso, eu amo, mas não dependo e assim tenho tentado viver um dia de cada vez.

E nesses dias, la no futuro, quero lembrar de estar com alguém que escolheu estar comigo todos os dias.

Que sente comigo aquela sensação boa de tranquilidade.

O seu coração fala com você de uma forma bem forte, não existe fuga dessa conversa.

Mas os próximos passos quem comanda é o seu cérebro.

Se você encontra o equilíbrio para isso, o caminho fica mais fácil para entender as coisas ao seu redor.

Mas o amor, tem que ser sem medidas.

Essa é a loucura que me encanta, a falta de limites para o amor.

Às vezes você só errou o tempo das coisas.

Mas se você sentiu as borboletas no estômago, todo esforço é valido.

Isso só é valido se você se conhece verdadeiramente, ou então vai cair nas ciladas das paixões platônicas, ou da carência de momento.

Paixões platônicas não me pegavam mais.

Já tive essa fase.

Mas depois de uma certa idade e autoconhecimento, eu sabia que procurava sentimentos reais.

Pessoas que conseguiam acessar lugares que outras nem ao menos conseguiam enxergar em mim.

Além do motivo principal, pessoas que me transmitiam paz.

Não havia algo mais forte que isso para mim.

Esse com certeza era um dos motivos por que era tão fácil se apaixonar por Faith.

Ela me lia, me tranquilizava e acima de tudo via em mim o melhor do Vigário.

Com 20 minutos de conversa, ela pegava toda aquela bagunça que estava minha energia, e parecia organizar tudo como um passe de mágica.

E tínhamos um contraste que sempre era fácil de visualizar.

Ela estava sempre linda e eu mal-humorado.

Nos estávamos bebendo e sorrindo no estádio de corridas de cavalo.

Essa foi a sua ideia de resgate, e estava funcionando.

Ela tinha esse tesão por apostas, nada a um nível viciante, mas o suficiente para dar a ela 

adrenalina.

Costumávamos ir às corridas de cachorros que eram comuns na cultura da cidade, mas as de cavalos eram algo maiores.

Enquanto bebíamos, fazíamos apostas.

Eu ficava ali lendo aquele documento com todos os dados e informações dos cavalos e das suas corridas anteriores.

Parecia um sábio.

Mas era tudo ilusão.

Assim como no seu dia a dia, você apostava suas fichas em uma escolha e torcia para que ela desse certo.

Era assim com relacionamentos, era assim com uma escolha profissional e mesmo com uma marca diferente de pão no mercado.

Muita informação só te confundia ou te cegava para uma vitória certeira que talvez não viesse.

Já apostei em muito cavalo errado.

Não sei como eu ainda tenho fichas para apostar.

Mas esse tipo de aposta faz parte da experiência.

Às vezes você escolhe realmente o cavalo errado.

Você se encanta de uma tal maneira, que nada vai te convencer que esta fazendo a escolha errada.

Mas o importante é você marcar sua posição e de alguma forma esperar o resultado.

Abandonar algumas corridas é a forma de se ganhar também.

Visualizar isso é difícil.

Mas com o tempo se espera que você entenda esse jogo e melhore nas suas escolhas.

Ou mesmo que desista de apostar.

Drástico, mas uma posição aceitável.

Eu ainda tinha energia para essas apostas, mesmo estando cada vez mais desanimado e sem estímulo para fazer la.

Se você não ganha algumas vezes, se desmotivar é automático.

E eu tenho perdido bastante.

Meus últimos cavalos não parecem motivados a ganhar.

Só tão ali figurando.

Faith levava tudo isso com mais leveza e menos filosofia.

Ela só estava la para se divertir e deixar rolar.

E olhava para mim com aquele sorriso de 300 dentes, como se tivesse ganhado uma aposta milionária.

Essa leveza eu não conseguia alcançar, era uma grandeza de poucos.

Meu instinto de querer ganhar tudo que eu me propunha, era talvez um dos meus maiores pecados.

Meu último cavalo foi uma aposta interessante.

Fiquei la flertando por um tempo, vendo seu pelo brilhoso e sua musculatura de atleta.

Ele trotava se exercitando e passava uma energia diferente dos demais.

Parecia sorrir para mim, enquanto se exibia.

Pensei, essa era uma aposta campeã.

Me criou todo um clima onde parecia que tinha sido feito só para ser minha aposta certeira.

Então, depois de muito tempo sem apostar e com uma fé abalada, achei que tinha achado o meu cavalo vencedor.

Decidido, apostei minhas fichas.

Vi aquele sorriso e aquele brilho se direcionar para mim naquele dia ensolarado.

Fazia muito tempo que não tinha aquela sensação tão forte de ter feito algo certo.

No disparar do início da corrida, todos correram e o meu cavalo não se mexeu.

Ele parecia entediado e nem ao menos largou.

A impressão que tive é que ele nem tinha interesse de correr por mim, só criou aquele clima antes de cavalo vencedor por ego.

E aquilo foi um balde de água fria.

Fazia tempo que não me sentia tão frustrado assim.

Uma desilusão sem precedentes.

O meu cavalo fez como os jovens de hoje em dia fazem na friendzone, me alimentando um sentimento e depois simplesmente me dando as costas.

Era mais uma aposta errada.

Nem aprendizado veio disso.

Talvez só que eu não entendia de cavalos.

Faith tinha apostado em um cavalo desconhecido que foi o primeiro a cruzar a linha de chegada.

Ela sorria e zombava de mim enquanto comemorava sua pequena vitória.

- Parece que todos esses seus milhares de relacionamentos não te ensinaram nada nas apostas certas. - Dizia sorrindo e me dando tapinhas nas costas de apoio.

Eu ficaria um tempo afastado das apostas em cavalos.

Parecia ser o melhor a se fazer.

Mas toda essa conversa com Faith já valia a pena a experiência.


O que eu podia fazer naquele final de tarde, era beber até esquecer mais uma aposta errada.


domingo, 29 de setembro de 2024

A droga perfeita

 



Já tive várias fases relacionadas a drogas.

Drogas de todos os tipos.

Mas as que não são ilegais são as piores.

Uma trip de ácido pode ser divertida.

Do mesmo jeito que pode te levar para um lugar obscuro que você pode não estar preparado para conhecer.

A potência das cores, dos sentidos é um caminho legal de se trilhar, mas também fácil de se perder.


Uma pedalada na “bicicleta” e você nunca mais será o mesmo.

O relaxamento da maconha é como uma massagem dos deuses.

Mas como vem dos deuses, não se pode confiar.

Cria uma neblina, afetando sua visão de mundo.


Para uns, ser míope é uma dádiva, para outros nem tanto.

Perde se o senso de orientação.


A parte da larica talvez seja a parte mais sedutora.

Mas nunca foi minha praia.


Eu sou o cara da ansiedade, relaxamento nunca combinou.


Os chás e cogumelos naturais demais normalmente pode ser uma viagem com a passagem só de ida.


A geração anterior é umas das que mais conheço gente que foi e nunca voltou.


Não sei se quando se trata de algo muito puro e muito enraizado na natureza, se o caminho é para nós relés mortais.


Sempre corri dessas.

Se me acelera demais eu tô fora.


Já sou um ser acelerado por natureza, então não toco esse tambor.


Meu corpo tende se a apaixonar por coisas que aceleram o ritmo.


Então sempre foi a deixa para não cair no vício.


O mundo hoje em dia parece ser das coisas sintéticas.


Essas tem um potencial absurdo para te destruir e também para te encantar.


Te levam para a euforia absoluta.


Fazem com que você atravessem um portal para outra dimensão.


Acho que essa paz, você só tem acesso segundos antes de morrer.


E por isso, o pós pode ser tão agressivo.


Assim como um teletransporte, não existe uma forma segura de ter essa viagem.


Aquela química vai afetar seu corpo de várias maneiras por bastante tempo, às vezes sem você nem perceber.


Seu corpo é levado a limites de várias formas, e para um ancião como eu, uma onda que me engole.


Mas é uma delícia.


Se você não tem intimidade com os seus demônios, cuidado.


Eles vão adorar qualquer uma que venha dessa galera.


Ali, você vai estar se vendo no espelho em uma imagem que você sonha em ver todos os dias.


Feliz e em paz.


Mas na vida real, não existe espaço para isso.


Cigarros sempre estão em alta, tem até as atualizações como vapers.


Nicotina é a droga que nunca sai de moda.


Crack nunca apareceu no meu mundo.


Não era muito o perfil do ciclo social que eu estava englobado.


Uma vez ou outra, bem raramente, eu ouvia dizer de alguém com mesclado, que era uma mistura de maconha com crack.


Não me parecia uma mistura interessante.


Cocaína era bem popular.


Principalmente nesse meu meio de escritores e famosos.


Qualquer festa que eu ia, era mais fácil achar pó do que uma cerveja.


A parte engraçada era que mesmo não sendo um fã de carteirinha, nas orgias do passado, estava sempre la.


Acompanhava meus passos sempre muito próximo, o que sempre me assustou.


Mas nunca encontrei alguém que brilhasse os olhos falando sobre a experiência.


Era uma droga que para ser contínua, te pegava pelo DNA, e não pela viagem.


Álcool já foi meu vilão preferido.


Eu estava sempre mergulhado em algum tipo.


Estar embriagado era uma sensação maravilhosa e a ressaca no dia seguinte algo que eu adorava.


Por um tempo, até achei que esse era o modo normal de se viver.


Acordando desnorteado com a boca seca e a cabeça rodando.


Bons tempos de exageros.


Nunca fui do tipo da amnésia alcoólica ou por drogas.


Se fiz alguma merda sobre efeitos de drogas, foi por escolha e consciente.


O que é a parte mais louca.


Também nunca fui do tipo que virava um zumbi sem reação.


Quando exagerava, meu corpo automaticamente desligava, como uma proteção.


Já fui muito bom bom em misturar as coisas.


Misturar as vibes fazia minha realidade ficar mais fora do que eu estava acostumado.


Mas meu corpo me xingava por meses depois de uma aventura dessas.


Chocolate era uma daquelas drogas que me perseguiram de forma reservada.


Eu não percebia, mas estavam sempre ali.


Talvez se aproveitando de algum momento de compulsão.


Mas era o melhor dos pesadelos.


Um cenário onde você tem um velho com uma barra de chocolate e um jovem com uma seringa, não acredito que seria julgado por essa escolha.


Injetáveis sempre foram algo que me deixava em panico.


Hospitais e agulhas eram coisas que eu abominava, então era fácil o meu discurso de, dessa água não beberei.


Muita dessas drogas tinham a ver com o seu círculo social.


Umas, era mais fácil de ver a sua volta, outras você ouvia falar ou via pelas ruas, onde normalmente você não estava englobado.


Talvez se eu parasse para falar sobre isso com Mr. Wolf e Riley, Crack e heroína fosse alguns dos companheiros de vida na rua.


Mas esse era o tipo de papo que a gente preferia não falar.


Compartilhar demônios não é uma coisa assim muito legal de se fazer.


Latini tinha um fraco por cocaína e suas festas sempre tinham uma vibe alpes suíços.


Nevava em todos os cantos.


John amava acido, até se casou com a turca do ácido.


A turca já levou praticamente todos da galera nas suas viagens.


Era a tia da excursão para esse destino.


Ari não era muito adepto de drogas.


Tinha um excesso ou outro mais sempre bem centrado.


Faith era apaixonada por experiências.


O que ela queria era memorias.


Se ela estivesse no espírito naquele momento, ela iria no que ela quisesse, sem pudores ou restrições.


Ainda assim, a mais sensata do grupo.


Rudolph era o padrão da polícia, cigarro e álcool.


No geral, sempre estava com um uísque na mão e cigarro na outra.


Também gostava de charutos e cachimbos.


Elliot tomava umas cervejas com a gente e fumava um baseado em vez enquanto, mas ele era da geração mais entediada que a minha.


Esse tipo de viagem não o atraia.


O problema dele era açúcar.


Ele sempre tinha duzias de doces com ele.


Logo, nosso grupo era meio que controlado no quesito drogas.


Eu sempre tive meus exageros.


Sempre fui um apaixonado por eles.


Então já passei em várias barraquinhas dessa feira.


Mas meus vícios sempre foram dois.


Álcool e mulheres.


Melhor, amores.


Essas eram as drogas que marcavam minha vida.


O álcool sempre foi um companheiro.


Com ele você jamais estava sozinho.


Mais talvez o problema era a nossa comunicação, assim como em um relacionamento.


Hoje em dia me comunico bem, melhor do que vários antigos amores.


Já as mulheres sempre foram um problema que só mudava de nome e características.


O estímulo maior, era que a cada uma que entrava na minha vida, era completamente diferente da outra.


Então era um jogo excitante.


Nunca fui um cara que seguia padrões com mulheres.


A não ser a loucura.


Mas toda vez que entrava uma mulher na minha vida e eu trilhava aquele caminho de desvendar sua alma, era ali que eu parecia descobrir a droga perfeita.


Paixão pode ser uma droga pesada.

Meu escritor favorito sempre dizia;


“Muito cara legal foi parar debaixo de uma ponte por causa de uma mulher.”

As mulheres sempre tiveram esse potencial na minha vida, umas, até tentaram.


E não tem essa de estar calejado, me apaixono pelo próximo amor como se tivesse 16 anos.


Deixo aquela droga fluir e com um sorriso no rosto e olhos brilhando quando a vejo, eu sou levado naquele efeito maravilhoso.


Consigo percebe na minha pele em segundos o potencial daquela droga.


Tenho algumas histórias de drogas com mulheres. 


Essas poderiam ter me tirado do rumo de vez.


Eu chamaria de um real coquetel molotov.


O problema que você joga em si mesmo.


Uma vez uma linda conhecida me guiou por uma viagem de MDMA.


Talvez essa historia vire um conto em breve.


Aquela trilha tinha tudo para dar errado.


A gente tinha uma atração assustadora.


Aquela ideia parecia ser o meu caminho sem volta.


E às vezes é o que procuramos.


Não voltar.


La estava eu novamente.


Deixando mais uma droga entrar na minha vida.


Vestindo meu uniforme de inimigo público internacional dos narcóticos anônimos com minha plaquinha na mão. Eu quero você.


O MD me levou para um lugar indescritível e com aquela droga perfeita no combo, eu era o cara mais feliz do mundo.


E toda vez que passava por uma experiência dessas, parecia que eu seria o próximo cara legal que iria parar debaixo da ponte.


Meu lema seria sempre, deixe ela te destruir e sorria.


Tem funcionado assim, pelo menos é o que consta nas minhas anotações.


domingo, 22 de setembro de 2024

Como um farol abandonado

 




Às vezes você só está muito cansado, esgotado.

Seu corpo responde de forma engraçada, o que faz você entender que algo está errado.

Sua saúde vai se deteriorando e só o que você pode fazer é torcer para melhorar.

A vida la fora ta acelerada demais.

Existe um refúgio onde me sinto fora dessa sintonia dessintonizada.

E lá, nessas poucas horas onde a ansiedade resolve descansar, eu torço para que esse curto momento nunca acabe.

É fácil desistir de tudo, quando você não tem nada.


Fico ali, horas, respirando mais calmamente do que o normal, tentando achar um caminho que seja confortável.

Cansado de andar descalço, pisando em cascalhos.


A jornada começa no começo.


E por mais que pareça óbvio, é sempre bom ter isso em mente.


Eu ajudo a dificultar esse caminho.


Vou criando minhas próprias barreiras.


Comigo sempre foi 8 ou 80.


Se for para conseguir metade, eu prefiro nada.


Só brigo pelo copo cheio.


E isso é bem mais desgastante.


Uma competição diária, onde existem milhões de pessoas e você só concorda em ser o primeiro, chega a ser idiota.

Talvez por isso, 1 dia de paz e 6 de depressão.


A luta de todo dia onde se já começa derrotado.


Sísifo na mitologia grega, punido pelos deuses por ser astuto demais e ter a chama da rebeldia queimando. 


Sua punição era empurrar pelo resto da vida uma pedra até o topo de uma montanha, onde sempre rolaria de volta sempre próximo do cume.


Aquele tarefa inútil, o esforço diário que não levava a lugar nenhum.


Aquele sentimento latente da falta de esperança.


Tem dias que eu levanto amargo, com uma nuvem negra no topo da minha cabeça.


Hoje era um desses dias.


Eles eram menos comuns que antigamente, mas ainda vinham com os pés no meu peito, me mostrando que eu não era essa fortaleza toda.


Na sua volta, os que deveriam ser apoio se tornam problemas.


Você recebe pressão de todo tipo.


É criticado o tempo todo.


Tem que lidar com manipulação emocional em cada esquina.


As pessoas esquecem de olhar a própria vida para opinar e atrapalhar seu caminho.


Suas escolhas são julgadas a cada minuto.


Se eu me importasse, isso seria um problema a mais.


Mas ainda, sim, isso é algo a se desviar, então você precisa de caminhos alternativos para fugir disso.


Você nunca vai se recuperar 100%.


Porque o mundo la fora não vai ter pena ou entender que seria de bom tom dá uma segurada no tempo.

Vai perceber que para se proteger, você esta abdicando de viver.


Seus sonhos são rascunhos de uma vida que você projetou no seu interior.


Por que abrir mão deles?


Por alguém?


Por algo?


Não sei, nada parece ser um motivo plausível.

Olhe para frente.


Perceba o cenário.


Entenda os detalhes do caminho.


Reveja seus excessos.


O que parece seu suporte pode ser exatamente o que esta destruindo sua paz.


Cuidado com amigos que interferem nas suas decisões.


Mostrar o ponto de vista de quem vê de fora, não pode ser pretexto para tentar guiar a sua jornada.


Fuja de mentores espirituais e terapeutas que só sorriem para o seu dinheiro ao invés de lidar com o seu problema.


Te tratam como uma criança mimada que não pode ouvir um não.


Talvez você seja.


Ouça o que o mundo fala com você.


Eu vim para o mundo e fiz minhas regras básicas.


E mesmo elas foram ficando adaptáveis.


O mundo tem milhões de pessoas para você deixar uma ou outra jogar sua vida em uma fogueira.


Foda se eles.


Não importa se tem seu sangue ou que repitam que te dão apoio por anos.


Tudo isso pode ser a construção de um personagem, um cenário ou mesmo uma lenda que todos contam por aí.


Se dê o direito de se ofender.


De virar as costas.


Deixe sua empatia falar.


E mesmo sua raiva.

Esse templo perfeito que as pessoas mostram, não existe.


Mas às vezes, a imagem é tão bonita e sólida, que leva você a uma fé cega em uma projeção feita com cores chamativas.


Não compre esse discurso.


A vaga do idiota da vez está lá, você pega se quiser.


O equilíbrio é a única resposta plausível para que você possa minimamente tentar achar um lugar onde você tenha calma para ir entendendo as respostas que precisa.


Não tem manual.


Nem eu, no auge da minha arrogância, viria aqui te ensinar a viver.


Até porque você estaria fudido com meus ensinamentos.


Mas tento errar menos.


Tento ignorar menos esses erros.


E entendê-los, para conseguir me entender.


Se conhecer pode fazer a diferença em frente a desafios.


Não ser a porra de uma sombra de alguém é a melhor escolha possível de vida.


A única que te garante a não mediocridade.


Mas você pode ser aquele que repete discursos dos outros por aí.


Pior, que só tem palavras colocadas por alguém. 


Alguém controlado e manipulado até mesmo nos movimentos.


Se seu líder religioso determina suas escolhas ou seu companheiro define seu caráter, você é um nada para o universo.


Desistiu de ser quem você sempre sentiu ser, para virar algo que alguém quer.


Quando encontro pessoas assim, posso até me enganar por um tempo com sua aparência e historia criada, mas a tendência é eu reconhecer esse vazio tão negativo.


Não é uma energia que me faça bem.


Pelo contrário, me dá repulsa.


Uma alma sem brilho que tem uma vibração que destrói a energia das pessoas a sua volta.


Eu vejo falsos sorrisos o tempo todo.


E tento cada dia mais me afastar deles.


Faço isso não só por mim, mas para que essas pessoas percam a relevância.


Deixem de sugar a vida de outros.


Tem dias que preciso gritar para me livrar dessas energias.


Eu vivo um dia de cada vez.


E nem isso é uma desculpa para eu ser um idiota irresponsável.


Minha visão de família não é a tradicional.


Meu mundo é amplo demais para seu desprezível modo de ver a vida.


Tudo é escolha.


E você escolheu ser um idiota.


Confunde sua petulância com coragem.


Arrota a cartilha que lhe foi imposta como um troféu.


Pobre menino.


A vitória de uns é a derrota de outros.


É para isso que existem os derrotados, para fazer os vencedores.


Parabéns, você conseguiu achar sua função nessa terra.


Continuem com esse sorriso bobo no rosto e aproveite seus dias de glória.


O tempo de seguir uma promessa de nada, acabou.


Sair desse buraco que você se encontra só vai depender de você.


Afastar essa escuridão ou deixar ela te consumir é sua escolha.


Eu consigo ver potencial nas pessoas e você tem o que pode mudar o mundo.


Mesmo que seja o seu, o qual é o mundo que mais importa.


A sua revolução colocará fogo na minha chama e na de muitos.


Sua felicidade vai iluminar o caminho dos que precisam.


Seu potencial será o farol abandonado que voltou para guiar as embarcações.


Você só precisa parar com esse seu foco.


Seu foco nas coisas negativas.


Isso te cega para as coisas positivas.


E com isso te cega para o mundo.


Sua cegueira tem cura.


Só depende de você e mais ninguém.


A hora que você retornar sua luz.


Meu barco conseguirá continuar o caminho.

domingo, 15 de setembro de 2024

Para sempre...

 




Depois de Florença, eu tive meu tempo de “reabilitação”.

Foram dias sombrios.

Desci diretamente ao inferno e sentei com meus demônios.

Era certo de que não sairia ileso daquilo.

Depois de algum tempo morando sozinho em uma cabana no interior da Noruega, era hora de voltar.

Voltar?

Como se eu tivesse controle da minha vida.

Maeve estava ali de frente para mim me dizendo que precisava ir para Nova York.

Em circunstâncias normais eu diria foda se e até rasgaria meu passaporte para não viajar.

Mas aquilo parecia uma responsabilidade que não poderia ignorar, mesmo ignorando por anos sem saber.

Uma sexta-feira 13 a noite, eu estava na “cidade que nunca dorme” e em vez dos filmes de terror eu falava sobre uma história de amor.

Mas não essas com finais felizes.


Talvez bem mais próximas dos mesmo filmes que a gente adorava assistir juntos.


Horror sempre foi nossa pegada.


Os desajustados funcionam melhor nesse ambiente. 


Latini e Elliot estavam comigo em um pub irlandês em Nova York, que era mais comum do que se imagina.

Mas esse era um especial.


Bem antigo e barato.


Frequentado pelos coroas mais tranquilos e gente fina da cidade.


Ali, só aposentados, sempre com sorriso no rosto.


Eu ia sempre que estava na cidade.

O dono do bar, aquele senhorzinho sorridente e simpático, sempre estava la para me atender.


Ele era um pouco surdo e sempre reclamava de como estava quente em Nova York.


Era tempos de verão, então a reclamação seria por um bom tempo.


Eu sempre o chamava de Chef, já que minha memória para nomes não era das melhores.


E no restaurante aprendi que esse era o jeito mais fácil de lidar com a rotatividade de funcionários.


3 doses de Jameson e 3 cervejas, era assim que íamos nas nossas rodadas na mesa.


O Chef não bebia mais há 30 anos, então só se divertia nos servindo e lançando umas pequenas piadas.


- Vocês bebem como irlandeses.
Foi bebendo assim, que resolvi parar. - Ele se divertia com sua própria maldição.

Um irlandês que não pode beber mais.

Essa era a sua história de vida.


Latini tentava oferecer dinheiro para que ele tomasse uma dose.


Esse humor errado de Latini, às vezes passava dos limites morais aceitáveis.


Chef sorria e no topo da sua experiência de vida, já conseguia identificar Latini como uma idiota. 


Ele negava a proposta com um sorriso tranquilo enquanto ia se afastando e fazendo com a cabeça para mim que estava tudo bem.


Elliot então tomava a frente para não deixar que Latini acabasse com aquele clima de amigos trocando ideia no bar.


- Você me prometeu que um dia me contaria sobre o amor da sua vida, se eu tomasse conta dela, hoje parece ser um bom dia para essa história. - Elliot com uma coragem rara me cobrava de uma dívida.


Latini então engasgou com a bebida enquanto arregalava os olhos.


Todo mundo do nosso grupo de amigos, sabia que eu não falava sobre isso.


Era um assunto proibido, não oficialmente.


Mas se alguém podia me perguntar sobre isso, era Elliot, e esse era o dia correto.


Nem mesmo Faith tentava.


Em algum momento da vida, eu dei a Elliot a missão de cuidar de longe, dela por mim.


Ele era uma espécie de anjo da guarda, já que ela não via e não sabia sobre.


Parece uma coisa meio doida e até meio errada.


Mas eu fiz uma promessa e ia cumprir ela ate o fim.


E dessa forma, sem nenhum tipo de intervenção, ele acompanhava sua vida de forma afastada.


Eu não queria nenhum tipo de relatório, apenas a orientação, qualquer problema informe a John.


Não soube notícias dela por anos.


Mas John, que também foi amigo dela, sabia dos meus temores e da minha promessa.


Eu parei por uns segundos pensando sobre aquele questionamento, e conseguia perceber o semblante desesperado de Latini e o arrependimento de Elliot, como se tivesse me ferido.


- Pois bem, porque não escrever essa história para você em uma noite de sexta-feira 13.

Uns chamam de meu primeiro amor, outros falam sobre o amor da minha vida.


Acho que tudo isso se aplica de alguma forma.

Era incomodo e até um pouco dolorido reviver esses sentimentos.


Pensar sobre eles me davam um pouco de taquicardia.


Mas eu estava em uma fase melhor.


A fase onde eu trocava uma garrafa por outra talvez não fosse o tempo de revisitar isso.


Ela era algo potente demais na minha vida.


Talvez a essência vital do Vigário que existe hoje.

Nos conhecemos jovens e foi amor a primeira vista.


Nunca tinha sentido nada parecido.


Uma avalanche arrebatadora.


A loucura dela se encaixava perfeitamente com a minha.


Era um encontro de almas que se amavam de outra vida.


E talvez por isso não tenha dado tão certo.


Viemos para essa vida com esse desgaste de outras tantas vidas.


Tivemos momentos que dinheiro nenhum no mundo compraria.


Não trocaria nem um segundo que passei com ela por nada, nem mesmo os piores segundos.


Ela era calma e doce de um jeito que parecia ter uma aura de paz em volta.


Nos tínhamos uma química que nenhuma tabela periódica conseguiria explicar.


Tínhamos cumplicidade, amizade e amor na mesma medida um pelo o outro.


Isso era raro de se ver.


Não tínhamos brigas e estávamos sempre conversando sobre tudo.


Isso parecia o relacionamento perfeito.


Até não ser mais.


Em algum momento, começou a aparecer seu lado obscuro.


A depressão.


E a depressão dela era um buraco negro.


Sugava tudo a sua volta.


Principalmente a minha força vital.


Então outras fases foram se acumulando a isso.


Drogas, tentativas de suicídio e depressões profundas.


Meses sem sair de casa.


Ela não tinha mais vontade de viver.


Eu me sentia responsável de alguma forma.


Como assim eu sou o amor da vida dela e não consigo salvar ela disso?


Esses questionamentos e cobranças me criavam um buraco negro tão grande quanto o dela.


No meu caso, o álcool foi o amigo que estaria la para me consolar.


E assim fomos se perdendo um do outro.


Foram anos de relacionamento e segundos para vê-lo definhar.


Ela foi virando um livro de promessas vazias.


Eu fui mudando com ela ao invés de trocá-la.


Jamais deixaria de brigar pelo amor da minha vida.


Antes eu parecia ser a razão dela respirar e no final eu parecia ser a razão para ela chorar.

Ver ela naquele estado me destruía.


Parecia que eu estava esperando pelo amanhã com a esperança de que tudo melhorasse.


Mas o amanhã nunca veio.


O amor dela por mim continuava la ate o final.


Mas ela sempre foi mais razão que emoção, essa era nossa diferença.


Em algum momento, ela entendeu que o problema dela estava sendo demais para eu suportar.


Dai o fatídico dia, da carta de despedida na minha cama.


No auge da sua depressão profunda, ela decidiu que só faria mal a ela mesmo, e me deixou.


Desde então nunca mais a vi.


Mas prometi a ela que cuidaria dela pelo resto da minha vida.


Não importaria onde ou como, eu estaria la de alguma forma.


E tenho feito isso desde então.

Antes por John e hoje em dia por Elliot.


Depois da sua despedida, ela ficou alguns bons anos lidando com sua depressão agressiva.


Anos sendo demitida das empresas que trabalhava devido às licenças medicas intermináveis.


Eu respeitei sua despedida e nunca mais cruzei seu caminho.


Procurei não saber nada sobre ela.


Apenas a mesma pergunta de sempre.


Ela está bem?


Era só o que eu precisava saber.


Até aquele momento onde Maeve me trouxe para Nova York para encontrá-la.


Eu jamais iria se não fosse pelo que ouvi.


Se ainda havia alguma coisa a dizer, era para esse dia que estava sendo guardado.


Aquele encontro e aquela revelação fariam de mim uma pessoa diferente a partir daquele momento.


Elliot me olhava hipnotizado ouvindo a cada palavra e respirar meu.


Ele sabia do peso e da importância daquele momento.


Eu tinha encontrado ela no dia anterior dessa conversa de boteco.


E me preparei para a sexta-feira 13 como um sobrevivente de um filme de massacre.


Latini que perdia o amigo, mas nunca a piada, não conseguia deixar de brincar com aquela notícia do dia anterior.


- Desculpa Vigário, mas é por isso que eu sempre digo, não seja o primeiro e não seja o ultimo. - Falava enquanto gargalhava.

Aquele encontro foi um divisor de águas na minha vida, mas acima de tudo provou para mim algo que eu sempre desconfiei.

Que seria para sempre.

quarta-feira, 11 de setembro de 2024

O luto de um eremita

 



Acabei de rezar para um Deus no qual não acredito.

Apenas para não sentir mais essa sensação de aperto no coração.

Uma angústia sufocante que machuca e me enfraquece cada dia mais.


Preciso lidar com o luto.

Luto esse, que ignorei por meses.

Luto que fingi não existir.

Entrei em uma série de lugares que achei que poderiam me esconder ou tirar esse sentimento.

Quando me acovardo com algo que tem o potencial de me destruir, vou para o meu jardim da insanidade.


Fico recluso la.

Excêntrico, diria o poeta.

O jardim que criei como refúgio, onde me afogo em exageros e estou rodeado de flores mortas.

Não existe a beleza das rosas.

Apenas aquele dia nublado e o ar pesado.


La minha ansiedade fica fora de controle.

Tira o ritmo dos meus batimentos.

Minha respiração é dificultada como se eu tivesse uma crise séria de asma.


Passo o tempo todo la com aquele choro preso mesmo sem entender o motivo.


Por alguns segundos tenho a sensação de que vou perder a consciência.

E isso se repete várias vezes no dia enquanto estou la.


Tremo sem nenhum controle.

Os dias se passam devagar e esse peso me segue por meses.

Com o passar do tempo, eu vou mais vezes ao meu jardim do que deveria.

E com isso vou me envenenando assim como toda aquela vida que já existiu ali.

Sem perceber, estou me amaldiçoando por não combater aquela sensação ruim.

Sinto aquele gosto amargo na boca de que eu não pertenço ali, e essa é a primeira luz no fim desse túnel.


Essa lição é demorada, mas ela me pega.

Eu preciso da sua companhia como preciso da luz do sol de volta ao meu jardim.

E perceber que isso não é mais possível é o que deixou meus olhos sem brilho e vazios.

Nos seus últimos dias estávamos bem próximos do nosso jeito.

Eu podia ter me preparado melhor.

Eu deveria ter feito suas últimas vontades.

Mas achei que estaria ajudando você a desistir da sua luta pela vida.

Sempre soube da dívida que teria com você mesmo antes de te conhecer.

Nos seus últimos minutos, eu não estava la dê mãos dadas com você.

Mas o seu último suspiro eu pude sentir do outro lado do mundo.

Aquela noite meu quarto tinha sua presença.

Sua energia estava ali.

Aquilo me pegou de surpresa, eu não tinha ideia do porquê daquele sentimento.

Voltei a dormir, até ser acordado com o anúncio do final do seu livro.

Livro que fiz parte de vários capítulos, e me orgulho enormemente de ter sido escolhido para essa história.

Seu sorriso não perdia o poder nem com toda aquela morfina.

Nem as suas dores deixavam você desistir de se preocupar comigo.
Você tinha o poder de trazer todo mundo de volta e eu consigo sentir sua decepção em me ver naquele jardim.

Você conhecia aquele jardim.

Já me pegou pela mão varias vezes, me trazendo de volta.

Depois que você se foi, me senti responsável.

Me culpei.

E com isso perdi minha esperança.

Talvez meu jardim não fosse tão ruim assim.

Mas ali, fingindo que o meu mundo não estava tão acabado, consegui ouvir você.

“Olha para o céu, procure as estrelas e foque na beleza delas.”

Você sempre dizia isso, seguido de um socão no meu ombro.

Sempre intercalando com uma voz doce e gestos não tão doces assim.

Essa sempre foi sua forma de tentar me trazer de volta.

As últimas palavras que ouvi de você ecoou minha cabeça a manhã inteira.

“Eu te amo, você me deixa muito orgulhosa”.

Esse amor puro e verdadeiro que você dedicou ao seu amigo vai continuar sendo meu resgate.

Foi aí então que resolvi encarar meu luto.

Era como se eu conseguisse ouvir você mandando eu levantar e parar de chorar.

Porque chorei.

Chorei como nunca.

E aquele peso no peito foi aliviando.

Voltei a passar o cadeado na porta do meu jardim.

Minha nuvem negra se dissipou.

Eu continuo pensando em você sempre, mas agora com mais alegria.

Eu entendi que, de alguma forma, eu ainda posso viver por você.

Pegar alguns dos seus sonhos e fazer deles, os meus.


Era hora de deixar de lado meu lado eremita e voltar a viver.

Cada segundo conta.

Por nós