quarta-feira, 22 de outubro de 2025

O fatídico dia da ruptura

 





O dia começou com duas bombas caindo no meu colo logo de manhã. A primeira, era o convite/solicitação para a minha visita à Mafiosa na prisão. Que nunca foi uma possibilidade plausível na minha cabeça. Mesmo com os apelos de que isso seria ótimo para continuar minha caminhada. Desculpa, mas eu não tenho nenhum interesse em me colocar na mesma sala que alguém que tentou me matar. Entendo quem tem esse discurso do perdão para qualquer situação, mas não é meu caso. Existem bilhões de pessoas no mundo, deixar que uma que me quis mal volte a minha vida, é no mínimo uma carência que deveria ser tratada como doença. Elliot também recebeu o mesmo convite e estava disposto a ir e veio pedir meu conselho. - Elliot, isso é muito particular, seus demônios só você sabe como alimentar. Não se sinta pressionado, influenciado ou julgado pela minha decisão. - e me pus em silêncio sobre esse assunto logo em seguida. A Mafiosa estava em algum programa de terapia dentro da prisão, e isso ainda poderia ajuda la com a pena. Ela sempre foi muito manipuladora, e eu não ia dar mais nenhuma brecha para isso. Esse assunto estava encerrado, mesmo que me afetando diretamente. Meu corpo tremia por dentro. Eu sentia meu interior queimar. Aquilo tinha um potencial destrutivo demais na minha vida e eu brigava para virar essa pagina. Pois bem, a segunda bomba vinha de quem veio tentar me convencer a ir visitar a Mafiosa logo cedo. Faith. Sim, ela mesmo. Minha coluna grega de sustentação do meu mundo atual. Que começava a ruir assim como os tempos áureos dos gregos. Faith estava tentando uma reaproximação com o babaca do ex, que até perseguir ela, perseguiu. Mas ele agora tinha um discurso de mudança. Devia fazer parte da igreja do Latini ate, mas não quis me aprofundar. Já falamos sobre esse ser humano desprezível em outros contos. Agora todo o discurso de Faith era sobre perdão e mudança. Esse conflito com os próprios demônios é super natural, mas não no meio do meu ano sabático, onde eu deveria estar sozinho. Mas era simples, eu não a julgaria e teria paz. A escolha delas são delas, mesmo que me preocupe. Se ele matasse ela, que foi uma preocupação uma época, seria algo que eu estava lavando minhas mãos em respeito a escolha que ela teve. Rudolph fazia o monitoramento dele a pedido de Ari. Eu sempre fui contra. Faith era uma adulta inteligente, uma das advogadas mais respeita do Rio de Janeiro, e tinha que ter sua liberdade e vida respeitadas. Eu jamais dividiria o mesmo ambiente que aquele babaca novamente, e ela já tinha sido informada sobre isso. Mas como se ela não estivesse cansada de fazer merda na vida dela, resolveu fazer na minha. Trouxe a Gato preto para fazer parte da minha viagem, dizendo que ia voltar ao Brasil e deixar ela para cuidar de mim. Aí aconteceu a pior discussão que já tive com Faith. E como resultado, algo impensável para todos. A ruptura. A Gato preto e eu tivemos um breve relacionamento, mas que nunca me deixou muito confortável. Pós Mafiosa, qualquer movimento de manipulação eu já ligava meu alerta. E ela abandonou sua vida pelo mundo, para se aproximar dos meus amigos e constranger minhas exs. A Cartomante foi uma que levou uma espécie de aviso, por continuar próxima de mim. Ela começou a aparecer em lugares onde eu estava e dessa vez estava tentando se infiltrar dentro da minha viagem, mesmo sabendo que eu não queria ninguém la. Faith fez essa ponte, com um discurso de que era hora de eu deixar de ser egoísta e começar a pensar sobre um futuro onde eu ficaria sozinho, sem ninguém. O egoismo e se priorizar é uma linha muito sensível. Mas eu sempre tive a certeza, de que prefiro ficar sozinho na vida, do que trazer pessoas para a minha vida que me fazem mal. Que já me fizeram mal e que com certeza irão me fazer mal novamente. Eu poderia estar morto agora graças a Mafiosa Fiquei doente por causa dela. Meu corpo quase desistiu por toda a influência negativa e toxica que ela colocou na minha vida. O perdão cristão nunca me fará ver isso diferente. Minha visão de mundo é muito maior. Não vou deixar a mesma idiota destruir minha vida, com um mundo de possibilidades. Me colocar nessa posição, só joga para o universo o quão desesperado por uma validação eu estaria. Me ver nesse ponto de fraqueza, sabendo que eu sou muito mais forte que isso. Que sempre tentei ser uma pessoa que não envenenasse a vida dos outros, não ia aceitar esse futuro. E a Gato preto era o mesmo. Não tentou me matar. Mas não era o perfil de pessoa que eu queria na minha vida. Eu olhava para trás e me via sem família. Poucos amigos ainda existiam. E mesmo assim, eu tinha orgulho da minha estrada e não tinha nenhuma preocupação em ficar sozinho. Isso me dava autonomia para fazer minhas escolhas sem ser dependente de migalhas. Migalhas essas que poderiam ser o meu final. Faith não gostou das palavras, deu as costas dizendo que então eu ficaria sozinho como sempre quis. E foi embora. Pela primeira vez. Aquela cena era inimaginável, triste, mas não mudava em nada minha visão de mundo. Novamente jogando na balança, não era egoismo, eu estava apenas me priorizando. Entrei em contato com Rudolph no dia seguinte. Pedindo sigilo sobre meus próximos passos. Eu iria sair do país onde estava sem informar a ninguém e ele era o único com estrutura para me achar se quisesse. Fui para o bar do aeroporto e pedi uma cerveja. Sentado no balcão conversando com o garçom, um clássico da depressão. Ali, lendo uma revista largada no canto, decidi meu próximo destino, talvez sem volta. Uma mulher senta ao me lado e da risada. - Eu estou indo para la amanha - Ela dizia sorrindo ao ouvir eu informar ao garçom que tinha decidido para onde ir naquele momento. Era uma Belga com traço asiáticos, de cabelos coloridos, muito sorridente. - Então parece que vamos continuar essa conversa no avião. - Eu brindava com a cerveja. E foi exatamente como aconteceu. No dia seguinte, após ter pegado as informações com ela, estávamos embarcando juntos, lado a lado no avião, para a próxima etapa da minha vida. Sem olhar para trás. Colocando em prática o que sempre acreditei. Que o mundo é muito mais.

sábado, 11 de outubro de 2025

Não era uma maldição cigana

 






Depois da festa de Ari, eu estava de volta a minha rotina na ásia.


Templos, Budas e paz.


Elliot veio passar uma semana comigo e Faith.


Aos poucos parecia que a galera ia se infiltrando na minha viagem, mas Elliot eu aceitei de primeira.


Nosso mascote parecia estar passando por uma fase não muito boa.


Na festa de Ari eu pude perceber que era um coração machucado.


Precise de 2 minutos de conversa para ele se abrir comigo.


Ele e a Cigana estavam se separando.


E claro, que eu, o coach da derrota, era a melhor pessoa para conversar com ele e mostrar que o mundo era aquilo mesmo.


De fracassos amorosos eu era um especialista.


Mas a experiência tinha me dado uma certa sabedoria sobre tudo isso.


Meu problema era como não despejar toda essa realidade na cabeça de Elliot de uma vez só.


Mas vendo Elliot olhar para o horizonte com a esperança de que os dias iriam passar e as coisas iriam melhorar, achei que era meu dever tira ele dessa expectativa.


Nos estávamos sentados de frente para um Buda gigante e resolvi tentar tirar Elliot daquele buraco com uma conversa informal.


O Buda, que estava envolto pela névoa, me olhava desconfiado tentando entender o que viria dessa conversa.


Uma coisa que aprendi, foi que o tempo não cura, o que cura é o que você faz com esse tempo.


Então só se lamentar ia manter ele envenenado nisso por eras.


A felicidade é uma escolha, mas nem por isso que dizer que será fácil.


Ser feliz é fingir que é feliz até ficar.


É assim que você levanta da cama todo dia, em busca do dia que você vai alcançar esse destino.


Mas não pode perder de vista que a vida é a jornada, não o destino.


Se você segue com verdade, vai aproveitar muito mais essa caminhada.


Porque sua consciência vai estar leve.


E se você não se arriscar, não vai merecer viver o extraordinário.


Elliot era um cara sensacional.


O melhor de nos todos.


Aquele grande e imperfeito cara, tao generoso e cheio de amor.


Leal como nunca existiu, mas que vai até a linha limite, e de la ele não passará.


Se a Cigana, que era uma menina bem legal também, não pudesse ver isso, talvez não merecesse ele na sua vida.


Crescer é fazer as perguntas certas.


E às vezes a gente se perde com as respostas.


Às vezes você se perde nas prioridades.


Em regra, você deve escolher a você mesmo primeiro, depois você escolhe quem te escolhe.


Essa segunda parte é muito importante, porque nem sempre conseguimos visualizar quem realmente escolheu estar com a gente, para qualquer que seja a situação.


Se você faz diferente, você já destrói o equilíbrio do universo.


E Elliot era esse cara.


Ele iria estar com ela, sorrindo assistindo series e comendo seus doces de sempre.


Mas também estaria com ela nos piores momentos que ela tivesse.


Com ele, ela nunca estaria sozinha.


A melhor parte que você demora a entender, é que ninguém é você, e isso é o diferencial.


Então era fácil de entender todo o amor de Elliot.


Com seu semblante sereno, e sendo abraçado por névoas intermináveis, o Buda parecia ouvir atentamente nossa conversa.


O fato de eu não pedir ajuda, não exclui da minha memória quem ofereceu.


E Elliot sempre esteve la por mim.


O que ele sofreu com a morte da minha vizinha e toda aquela loucura dos tempos da Mafiosa, afastaria qualquer um de ter um convívio comigo.


Mas uma coisa eu aprendi, e ele estava aprendendo na marra.


Você aprende mais, no fundo do poço do que no topo da montanha.


E ele estava nos dois ao mesmo tempo.


Ali ele teria que entender se ela estaria com ele no mesmo barco, para remar junto, porque do contrário só iria atrapalhar seu futuro.


E aí o certo era rema sozinho.


Sempre achei Elliot muito precoce.


Talvez por andar com um grupo muito mais avançado de idade do que ele.


Ele parecia ter pressa na vida.


Sempre tinha uma ansiedade de quem estava atrasado.


E eu sempre fazia o mesmo questionamento para ele.


Como você pode estar atrasado na vida, se a vida é só sua?


E ele sempre sorria com minha pergunta, mas não dessa vez.


Elliot ia sofrer mais um pouco.


Mesmo que a Cigana e ele voltassem ao normal.


Essa ferida só se cura com o amor, que também é responsável por abrir a mesma ferida.


Existe um equilíbrio saudável, onde os dois tem que estar dispostos a lutar junto, a abrir mão e acima de tudo entende o limite do outro.


Fazer jogos e brincar com esses limites era sempre um caminho que ajudava nessa avalanche no relacionamento.


Mas só ele poderia concluir se valia a pena ou não.


Ele parecia estar no limite.


Ela aprendeu a fazer barulho com o silêncio. 


Eu não tinha conselho para dar, a não ser, que ele confiasse no próprio coração.


Quando você não gosta de onde você esta, você tem que se mexer.


Você não é uma árvore.


E isso ele já sabia.


Eu comecei a ficar deprimido, vendo ele na minha frente daquela maneira.


Faith voltava da sua caminhada pelo templo, dizendo que não estava se sentindo bem.


E de repente o ar pesou.


O Buda tinha um semblante pesado agora e por uns segundos eu achei que ele tinha sido afetado pela nossa conversa.


Mas não, algo que eu nunca tinha sentido estava acontecendo.


E me veio uma sensação de que o mundo tinha parado.


Por alguns milésimos de segundos que pareceram horas, eu vi Elliot e Faith na minha frente paralisados.


Pássaros cruzando os céus, congelados no ar.


O Buda tinha um tom de tristeza no seu rosto.


E eu estava tão confuso que meu cérebro tentava me dar as informações e eu não conseguia assimilar.


A terra tremia.


E eu não percebi, só senti todo o mal-estar que isso trazia.


Sentia a energia desorientada que aquilo transmitia.


Senti os braços de Elliot se jogarem em mim e ali no chão abaixado por míseros 1 minuto, vi o mundo se transformando ao meu redor.


Parte do templo desabando e gritos ensurdecedores a nossa volta.


Não era uma maldição cigana, estava acontecendo um Terremoto.


sábado, 4 de outubro de 2025

O silêncio antes da tempestade

 





Eu sempre fui mais razão que coração.

E continuarei sendo.

Mas isso nunca me limitou de também agir impulsivamente.

Pelo contrário, tenho esses rompantes onde meu coração é quem guia.

Normalmente é onde se instaura o caos.

Olhando para trás, eu não tenho tanto arrependimento assim.

Minha confiança sempre foi dada de coração.

Mas as consequências da quebra dela, com a razão.

Quanto maior nossa ligação, maior será a desconexão em uma eventual quebra de confiança.

Às vezes, com mágoas, mas no geral de uma forma bem fria, onde simplesmente essa pessoa deixa de viver no meu mundo.

Pacto claro, amizade longa.

Eu sou muito aberto e darei meu melhor para quem eu trouxer para esse lugar.

A empatia talvez tenha me fudido nessa caminhada.

As pessoas acham que os traumas delas, autorizam elas a virarem algo perverso.

Eu não posso pegar meus traumas e incorporar a minha personalidade.

Se isso estiver se entranhando na sua personalidade, você esta perdendo essa batalha.

E vai machucar todos a sua volta.

Por isso criei um lema onde a solidão parece ser mais confortável.

A real solidão.

A que você se coloca, e não a que você é colocado.

Minha geração parece não lidar bem com dificuldades.

Querem construir um prédio do dia para noite.

Não acreditam no potencial de uma obra planejada, calculada, pedra por pedra.

Dia por dia.

Na primeira dificuldade, colocam tudo em risco.

E o projeto perde o brilho.

Vai perdendo de vista os pontos de segurança.

E aí, sim, não parece um lugar para apostar como lar.

A mesma geração que sofre da síndrome de Peter Pan.

Não entendem que a vida são fases.

E saber viver elas de forma diferente, é o sentido do verdadeiro viver.

Se você tenta replicar seu modo de viver de uma fase anterior, a vida vai te atacar.

Você vai se perder, e nem ao menos vai perceber.

A sua volta, o mundo antigo vai continuar trazendo os seus problemas e agora vão se acumular com o da vida atual.

Com o que eu chamaria de, vida real.

O envelhecimento, se visto da forma correta, vai te trazer os melhores sabores do mundo.

Eu tentei me jogar no mundo para abrir meus horizontes.

Expandir minha mente.

Nunca foi fuga.

Demorei, mas entendi minha fase da vida.

Mas sempre tem desafios.

Me encontro em uma encruzilhada.

Se eu for a esquerda, eu sigo o coração.

Já a direita, a razão.

Encruzilhadas nunca foram problema para mim, mas dessa vez, me fizeram repensar todas as minhas escolhas anteriores.

Faith ficará louca se perceber que eu cogito abandonar tudo e desaparecer.

Também cogitei voltar para minha antiga vida e me isolar com minha gata Filé de peixe.

Mas não seria justo com ela.

E eu não teria paz.

O desaparecer como uma estrela que brilha pela última vez, tem sido um projeto.

Mas que seu último brilho seria mais brilhante que a luz do sol.

Eu nunca fui alguém que acreditasse em destino.

Esse livro escrito onde nos só passamos as paginas.

Por mais que tudo pareça ir seguindo como um organizado alinhamento de planetas, é difícil demais para mim acreditar que não tenho escolha.

E isso sempre foi um desafio.

Até mesmo para eu não criar desafios apenas para provar um ponto.

Cada dia que passa eu me esforço para não deixar que meus machucados adquiridos no caminho me direcionem.

E essa parte até que não tem sido tão difícil.

Sempre tive muito cuidado para que minhas merdas não afetassem outras pessoas.

Talvez meu próximo passo seja o mais importante e maduro que eu darei, e por isso a minha preocupação.

Eu estava sem energia social também por esses tempos, mas teria que ignorar esse fato por essa noite.

Pelo bem de Ari.

Ari ficou chateado por eu não deixar que ele e a tropa toda viesse viajar comigo pela ásia.

Desde então, não me procurava mais.

Mas misteriosamente, esse ano ele iria comemorar seu aniversário em Hong Kong.

Eu parecia não ter desculpas, já que até o continente da festa era o mesmo que o que eu me encontrava.

E la estava eu com Faith, na terra do Bruce Lee, indo para uma noitada com Faith pelo equilíbrio da equipe.

Não sobrevive o mais forte, mas sim o mais adaptável.

Aprendi isso as duras penas.

Então estava me adaptando ao cenário.

E também, para evitar mais drama.

Ari, quando quer drama, tem o mesmo potencial da sua fortuna.

Eu não estava triste em rever os amigos, mas parecia que eu estava vibrando em outra energia.

Antes minha vida parecia corrida demais.

O problema da vida corrida é se você não sabe o porquê está correndo.

Agora, eu estava diminuindo o ritmo e vendo aonde meus passos me levariam.

Entendi que antes, eu estava correndo e que realmente não sabia para onde.

Mas ok.

Uma noite com grandes amigos, não ia me tirar o foco dessa minha busca na ásia.

A noite estava muito bonita.

Era noite da lua cheia de sangue.

A lua estava enorme, brilhante e imponente.

O seu avermelhado parecia me convidar a um estado contemplativo.

E assim o fiz.

Desacelerei.

Deixei minhas decisões para o momento adequado.

Que com certeza não seria aquela noite.

E foi a melhor decisão que tive.

Aquele rosto irritado se desconstruiu em segundos com o meu abraço.

Até algumas lágrimas desceram, e o sorriso mais sincero tomou conta daquele rosto.

Ari tinha ganhado a noite com a minha chegada e eu estava perdoado.

Faith e John sorriam no canto assistindo à cena.

Latini estava próximo, conversando com alguém com aquele tom alto, como de costume.

Elliot conversava com duas mulheres ao lado, e de cara pude reconhecer que uma era a Gato preto.

Resumindo, aquele caos que me completava estava montado como sempre.

Peguei uma cerveja, e dei um gole longo, respirei fundo e deixei toda aquela crise existencial para outro momento.

A ásia ainda ia mexer muito no meu mundo.

segunda-feira, 25 de agosto de 2025

Pior que tsunami, Faith está na Ásia

 





Finalmente Faith estava de volta a minha vida, mesmo que temporariamente.


Chegou com aquele pé na porta como sempre e eu amava ter ela ao meu lado novamente.


Bali agora brilhava diferente.


Faith era uma das poucas que conseguia me acessar e me entender.


Era como se fossemos irmãos de alma.


Nos tínhamos uma vila inteira, com uma piscina de borda infinita de frente para o mar.


Eu não me ligava a dinheiro, porque hoje em dia Ari não deixava eu pagar por nada mais, muito menos com Faith.


Mas posso garantir que aquilo não era tão caro quanto parecia, não em Bali.


Eu tinha feito os sanduíches que ela tanto amava, e ela complementava com seu ritual de paz, que adicionaria cerveja e Ramones de fundo.


Já passei tantas vezes por esse ritual e assisti ela tão leve, que até me fazia bem hoje em dia.


Mas ela estava irritada comigo por algo, e sabia que ela não ia deixar de externar.


- Porque você esta tentando se esconder do mundo de novo - Ela dizia sem cerimônia olhando fixamente para os meus olhos.


E eu negava dando um gole na minha cerveja e sorrindo.


Falei com a Gato preto, e parece que ela estava decidida a vir para Bali e você cortou ela.

Você também não está tentando afastar ela? - A ironia de Faith conseguia ser pior que a minha.


Pela primeira vez estava assistindo Faith fazendo lobby para alguém ficar comigo.


Mas Faith sempre foi a minha melhor amiga, porque sempre entendeu os meus motivos.


E la foi eu, tirar ela dessa trilha louca que ela queria trilhar.


Um pouco antes de eu começar meu ano sabático, eu reencontrei a Gato preto na minha cidade pela vigésima vez.


Ela sempre ficava pelo mundo, ai após 1,2 anos, voltava uns meses para Limerick.


A gente se envolvia e sempre parecia que talvez fosse a hora de isso virar algo a mais.


E assim que ela sentia isso, ela corria.


Antes eu achava essa liberdade dela apaixonante, mas com o passar dos anos e a convivência, percebi que era apenas medo.


O medo vinha, e ela fugia, mas colocava um papel de parede lindo de liberdade.


E isso nunca foi um problema para mim.


Até ser.


Do momento que ela começou a tentar entrar na minha vida.


Aquilo não era certo.


Era cercado de joguinhos que não cabiam mais.


Não existia uma atenção verdadeira.


Parecia uma peça de teatro, uma encenação.


E ela não se livrava do passado.


Parecia ter uma esperança que aquilo voltasse a vida.


E isso me matava.


Foi me matando aos poucos.


Até o ponto que meus olhos não brilhavam mais com ela.


Às vezes você vai se machucar por escolha própria.


Mas eu aprendi com a vida a saber estar em pedaços, sem machucar ninguém com os cacos.


Ela não parecia ter essa noção e isso me afastava mais dela.


A minha despedida dela foi a fatídica festa de Halloween.


Menina da neve estava la.


Meu doce pecado também.


A guitarrista me cercava e minha vizinha e Faith entraram em uma estação completamente errada nesse dia.


Então eu consegui ser diferente do Vigário do passado, e focar na minha saúde mental e nos meus sentimentos.


É engraçado ler eu escrevendo sobre meus sentimentos abertamente.


Parece que finalmente eu amadureci, ou apenas envelheci.


Não participo mais dos jogos, pelo contrário, pego ranço hoje em dia.


Resolvo tudo conversando e jogando limpo.


Me deixando ser vulnerável.


O que eu condenaria muito no passado.


Mas cheguei a um ponto onde entendo, que se alguém se aproveita quando você baixa suas defesas para ela entrar, o problema não é você.


Empatia continua sendo meu mantra


Não me alimento mais de arrependimentos.


E minha tatuagem continua dizendo a primeira regra.


Não tente.


Se não for mergulhar de cabeça, não tente.


Se não estiver disposto a dar All in, não sente na mesa.


O passado fica no passado, só trazemos as lições de la.


Porque o passado é como um gás venenoso que fica agarrado em você e envenenando todos a sua volta.


Enquanto você não se livra disso, só vai machucar os outros.


Eu podia vir aqui e usar a desculpa de que estou ferido e trazendo os traumas do meu passado com a Mafiosa.


Muitos a minha volta parecem me dar esse salvo-conduto.


Mas depois que você entende quem você é e reafirma seu caráter e o que você quer para sua vida, no meu caso, isso, não cabe mais essas situações.


Então resolvi não mais me relacionar com Gato preto, nem mesmo por diversão como nos velhos tempos.


Mesmo com a licença poética que ela adora usar, de somos livres.


Essa falsa liberdade já encheu meu saco.


Faith olhava para mim com aquele olhar de admiração que ela me jogava em vez enquanto.


Parece que minha explicação tinha sido aceita.


- Nossa, Vigário, quem diria que o cara que despedaçava corações por aí com a desculpa de estar cheio de traumas e cicatrizes, iria virar alguém preocupado com responsabilidade afetiva. - Ela batia palmas com um pouco de verdade e muita ironia ao mesmo tempo, enquanto era pega no seu ato falho e gargalhava.



Mudei bastante desde aquele fundo do poço que narrei aqui por anos.


Já fiz muito mal aos outros.


Mafiosa foi um sintoma de uma doença que eu estava virando.


Não justifica os atos dela, mas também não justifica os meus.


Cansei de relacionamentos de fachada.


Que a pessoa se esconde.


Te machuca pelo simples sentimento falso de ganhar um ponto defendido.


Ficar pisando em ovos.


Relacionamento onde devido às minhas merdas, eu colocava a pessoa como se fosse em uma camisa de força.


Isso sufoca, isso mata.


E eu já estive nessa posição horrorosa de sufocar alguém.


Não vou mais repetir isso.


E pretendo não mais participar disso.


Então a Gato preto não foi pega de surpresa.


Deixei bem claro para ela mergulhar de cabeça ou nem vir para a piscina.


Mas ela achou que o antigo Vigário continuaria encantado com seus belos olhos e seria distraído por mais alguns anos.


Não mais.


Enquanto Faith fazia seu showzinho dançando com uma cerveja na mão, dando suas gargalhadas e batendo palmas para mim, eu apenas sorria.


E meu sorriso foi crescendo e ela percebeu que tinha algo diferente nele.


Atrás dela, os seus sanduíches eram roubados por uma gangue de macacos de Bali.


Eu assistia aquela cena como se estivesse em um cinema de tela gigante.


Estava apaixonado por Bali e pela minha vida novamente.


Faith resolveu que ia ficar comigo no meu sabático até eu dizer que não queria mais.


Então parecia que a Ásia ia tremer pelos próximos meses.


sábado, 26 de julho de 2025

A vida não vai esperar

 




Refletindo sobre o Vigário do passado, ou como Latini gosta de dizer, o Vigário do antigo testamento.

Fiquei analisando minha vida até aqui, para quem sabe, em uma oportunidade de encontro com o meu eu do passado, eu possa evitar os mesmo erros.

Preciso mostrar a ele, que só resmungar das pedras no caminho que eu mesmo coloquei, vai só envenenar a vida dele, logo a minha.

Que essas pedras, são cascalhos e entulhos de muros que destruí por minhas próprias escolhas.

Escolhas erradas ou afobadas.

Ou simplesmente que me levaram para fora do foco do que eu queria para a minha vida.

E escolhas erradas nos não lamentamos.

A vida não tem tempo para isso, você vai atrás da correção de rumo.

Não me jogue esse olhar de quem está lendo um coach da felicidade.

Me respeite, aqui é só algo sobre conhecer as próprias falhas e tentar lidar com elas da melhor maneira possível.

Tem uma teoria, sobre a vida da minhoca, que se aplica aqui.

A minhoca fica debaixo da terra, onde é seu lar, super agradável.

Por ela, ficaria la toda sua existência.

Mas sempre tem algo externo que vai afetar sua vida.

Com a minhoca não é diferente.

Então quando chove, encharca e afeta a respiração delas.

Não é mais confortável ficar ali.

Ela precisa sair e encarar o mundo para poder respirar, mesmo que temporariamente.

Para conseguir achar uma área de conforto novamente.

Às vezes para munda sua vida em definitivo.

Mas o mundo la fora é perigoso.

Se você não abre sua cabeça, não se prepara, vai ser engolido.

Então é algo muito comum acontecer, o chamado suicídio de minhoca.

Elas saem daquele mundinho confortável e reduzido e dão de cara com o calor do verão no mundo la fora.

Morrem secas.

O mundo engole elas.

Esse, normalmente, é o padrão.

Mas o que fazer em uma situação como essa?

Fica vivendo desconfortável?

Sem ar para respirar?

Ou arriscar é achar o que vai alimentar sua alma mais uma vez?

Antes de mergulhar no mundo, eu li sobre o suicido de minhoca.

Preciso ser honesto, isso sempre me assombrou.

Me congelava, impossibilitando qualquer movimento mais brusco.

Mas, ao mesmo tempo, a falta de ar me matava aos poucos.

O só sobreviver já não era mais suficiente.

E nessa trajetória, você vê o mundo continuando.

O que é realmente incrível e te pega de surpresa.

Pois inconscientemente, seu cérebro te dá uma sensação de que o mundo parou, e vai esperar por você.

Erro crasso.

A vida não vai esperar por você meu amigo.

Não mesmo.

A terra não vai parar seu movimento de translação e rotação por você.

Essa sensação é só um conto de fadas entranhado na sua cabeça.

Às vezes a ignorância é uma benção, e o final da minhoca, é um caminho mais digno.

Você vai precisar entender se essa grandeza atual de escolhas será uma dádiva ou uma maldição.

Não será um deus pagão que dirá isso para você, serão suas escolhas.

Minha mente no momento flutua entre uma paz absoluta e um caos insano.

Eu estou no início do calor confortável de um incêndio na minha casa.

Flerto com dias que pareço me aproximar do nirvana, e em outros que pareço estar escrevendo um diário de um homem louco.

Vejo luto ao meu redor o tempo todo.

Me vejo olhando o horizonte com aquele tremor na pálpebra que parece anunciar um colapso.

Mas como?

Se meu estado se aproxima da paz mais leve que já me aproximei na vida.

Por alguns segundos consigo esvaziar minha cabeça e entrar em um comodo silencioso.

São segundos até meu cérebro voltar com aquela carga de ansiedade acumulada, mas parece uma eternidade quando consigo acessar esse lugar.

Eu sempre fui alguém que caminhou sozinho.

Não é um orgulho, muito menos uma reclamação.

Só uma constatação.

Que comecei a pensar sobre, já que as pessoas a minha volta não parecem entender isso.

Eu não decidi fugir do mundo, eu decidi viver.

A ásia tem sido uma experiência surreal.

Nunca pensei que o mundo seria tão diferente na superfície.

Tenho que me policiar para não ficar deslumbrado, com os olhos brilhando enquanto esqueço que o sol pode me secar e acabar com meu sonho.

Assim como as minhocas.

E por mais que o fator da racionalidade seja um diferencial do ser humano, é realmente muito fácil se aplicar ao quão pequeno somos no universo, quando nos vemos em uma situação igual a de um ser tão minusculo perante nos.

Metáforas, ainda que metáforas, te dão a dimensão do mundo.

Na minha busca de uma forma diferente de ver o mundo, pareço estar bem afastado do Vigário que vocês conheceram.

Trocando a vida mundana, por tardes ensolaradas em templos hindus.

Álcool por água de coco.

Nesse meu sabático,dei ferias para os meus demônios.

Pelo menos por enquanto.

Ari já quis me encontrar, e eu neguei o convite.

Ele está chateado com minha negativa.

Disse que ficar solitário em Bali é um pecado.

Faith também já se colocou à disposição para passar uns dias comigo.

Que neguei educadamente.

Mas ela é muito mais sagaz que Ari.

Ela me entende só no meu tom de voz.

E numa chamada de vídeo, ouvindo me falar de como estava sendo minha experiência, com aquele lagarto barulhento de fundo, que você só encontra em Bali, ela entendeu que eu precisava desse tempo sozinho.

Mas ainda, sim, me ligava a cada 2 dias, não mais que isso.

Ela sempre entendeu que meu espaço não se confunde com solidão.

- Ok, mais 1 mês se descobrindo e eu te encontro no país que você estiver para passar uns dias com você.
Nem na nossa adolescência a gente tem tanto tempo assim para se descobrir
- Dizia ela sorrindo e se impondo.


Eu não tinha muita escolha, já que esse foi o combinado desde o início quando ela me apoiou a me jogar pelo mundo, e virou a mãe temporária da minha gata Filé de peixe.

Eu gostava da companhia de Faith.

Com ela não me sentia pressionado e era alguém que estava sempre tentando diminuir o ritmo acelerado do dia a dia.

E tem essa coisa, de que eu precisava me adaptar novamente a ideia de que o mundo não parava.

Meus amigos ainda faziam parte da minha vida e eu nunca tive a intenção de dar as costas para isso.

Tem momentos que eu paro e me pego pensando se o que eu estou fazendo faz sentido.

Já que a minha vida também não parou.

Posso estar mudando ela agora ou apenas atrasando meus passos para um futuro que não consigo imaginar qual é.

Meus momentos trancados não são mais constantes como eram.

Minha reclusão tem sido mais mental.

Porque a vida não tolera mais que eu jogue minha vida fora.

A vida não vai esperar eu querer viver.

Vai me enterrar antes de eu perceber a beleza do que é o arriscar.

As cegas, como um salto de fé.

Então decidi sair para respirar e parar de me lamentar que estou sem ar.

E parece ter sido a melhor decisão da minha vida.

Se deixar ser soterrado pelos problemas era um padrão que eu seguia.

Minha desculpa era a dificuldade da vida e acumulo dos problemas.

Aquela bola de neve não parava e eu fugia da realidade com minhas drogas, como o álcool e relacionamentos tóxicos por opção.

Até por negligência a gente escolhe os rumos que a nossa vida vai seguir.

Então optei por não me omitir mais.

Não foi fácil e nem está sendo, mas a mudança de postura já é o diferencial.

Me olhar no espelho e me lamentar de como a minha vida está sendo injusta comigo, não é uma cena mais aceita.

E não tem nada de otimismo nessa forma de lidar, continua tanto difícil quanto.


Mas a minha postura para lidar com o que vem pela frente tem o ideal de ser mais amplo e pensado como eu sempre quis que fosse.


Eu sempre me orgulhei de boas construções de personagens e suas histórias, não fazia sentido não fazer isso com a minha própria


Se eu morrer amanha, pelo menos percebi a beleza novamente nas imperfeições e decidi viver nelas.


segunda-feira, 5 de maio de 2025

Mas o dia se foi

 




Acorda, Levanta a cabeça com o seu mau-humor habitual e vai.

Para onde, ninguém sabe, mas vá.

Se você não for, ninguém pode ir por você.

Depois de um tempo você ate entende um padrão, mas jamais o sistema completo.

Tem gente que ignora esse padrão, esses são fáceis de identificar.

A vida bate em silêncio neles.

A vida ensina de principalmente te dando perdas.

E no geral você nem percebe.

Você chora, se lamenta ou simplesmente é imaturo demais para entender o que esta perdendo.

Idade faz uma diferença absurda, mas não é nem de longe o que esclarece as coisas.

Percepção do mundo é o que diferencia seus próximos passos.

E você tem que conhecê-los, para quando o dia se for você não sair do seu caminho.

Deixe chover la fora.

A tempestade também é um bom sinal.

Vai lavar e levar tudo de negativo.

Até o recomeço com aquele brilho de luz do sol que vai te trazer de volta uma esperança que estava afogada em escuridão.

Seu caminho é você que faz e vai sempre ser.

Suas lutas é você que escolhe.

Sua alma é seu guia, sua bússola.

Podia ser um dia ensolarado na praia da ásia já, mas era um dia chuvoso em um restaurante de comida nigeriana.

Completamente fora da minha área de conforto.

Mas eu também gosto de desaparecer na chuva às vezes.

Noites de filmes e de sorrisos leves e sem culpa.

Você recebe o que você dá de si.

Recebi paz e um abraço apertado.

Nenhuma palavra fica ao vento comigo.

Nem mesmo as mais rebeldes e fora de hora.

Um dia de cada vez.

Esse era meu lema.

Até que você entende que o dia se vai.

Que não importa o quão forte seja o momento, o tempo não para como nos filmes.

O dia se foi.

E você perdeu tudo.

Amanhã você levanta de novo, mas o peso do dia que se perdeu, vai caminhar com você.

E eu podia ficar por horas ali na minha janela vendo a chuva cair e deixando aquela paz me tomar.

Mas eu não tinha esse direito.

Essa era a punição da vida para mim.

E quando você percebe isso, você vai ter que caminhar pela escuridão.

Vai carregar um peso a mais de bagagem.

Vai chorar e se lamentar pela falta de percepção, pela falta de coragem.

Serão dias difíceis, dias duros.

Espero que você não se perca nessa escuridão.

Espero que esse amargo não te envenene.

Sou seu amigo do futuro que aparece de frente para você quando você olha no espelho.

Sei que você luta para evitar conselhos, mas me ouça dessa vez cabeça dura.

Anote em uma folha de papel essa suas palavras sobre a escuridão e use como um mantra.

Guarde na sua carteira e leve para seu caminho.

Use como um mantra.

Repita.

E repita.

Quantas vezes for necessário.

Até você sentir que isso não te machuca mais.

Mesmo os longos dias se vão.

Existe uma lógica por trás de tudo e você nunca vai entender o sistema inteiro de primeira.

Então continue caminhando, até tudo fazer sentido.

Chore pelas pessoas que valham a pena.

Elimine a existência na sua vida das que te fazem mal por querer.

Seja quem da a mão sempre para apoiar.

Não importa em que momento da vida é, esteja la por ela.

Não se esqueça da sua essência.

Quem você virou, e brigou para ser.

Ouça a estranha que disse que você tinha uma luz enorme e era especial.

Não seja o amigo de copo.

Que só se faz presente nos momentos de beber ou demonstrar algo para uma rede social.

Essa futilidade nunca foi você.

Você é quem sofre com os seus.

É quem renuncia de sorrir para passar dificuldade com alguém que você quer levar para sua vida.

Não importa o lugar.

Festa, cemitério, trabalho, hospital, uma videochamada ou mesmo aquele cantinho de conforto que você criou.

Você sempre foi diferente deles.

Seja ele novamente.

Esse texto tem muito ‘VOCÊ’, parece até uma vibe de autoajuda.

E por um lado até é.

Às vezes repetir em voz alta faz eu lembrar que o dia acaba e que não posso só me lamentar.

Esse é o ponto positivo de uma terapia escrita.

Corações gelados também quebram.

Mas respiramos fundo antes que as palavras que eu escrevo desapareçam.

O caminho nunca termina.

É só não parar de caminhar.


terça-feira, 29 de abril de 2025

Como a assinatura em um bilhete




Eu perdi as contas, mas cheguei na conclusão que faz 20 anos desde que me despedi dela.

E tento entender como isso ajudou a moldar esse meu eu atual.

Ela sempre quis que eu fosse diferente de todos os homens do mundo.

O amigo dela tinha que ser o mais leal e de caráter indiscutível.

Ela me guiou por várias etapas nebulosas da minha vida.

Aprendi e amadureci em cada conselho e puxão de orelha.

Ela odiaria me ver derrubado.

Talvez a obra dela não tenha ficado perfeita por falta de tempo, mas ela se esforçou.

 Fazia muitos anos que não sentia mais sua presença.

Até aquela jornada inesperada.

O Caminho de Santiago


Eu sentia uma energia diferente a cada dia de caminhada.

Mais como um livro aberto na minha frente, eu conseguia ler as energias que eu encontrava pelo caminho.

No geral eram energias positivas, de esperança e fé que as pessoas emanavam.

Mais naquele ultimo dia de caminhada, um senhor de coluna arqueada e passadas pequenas, sorria para mim com uma energia diferente.

- Sua amiga tem uma energia ótima e vai com você te protegendo até o final - Com o mesmo sorriso tranquilo, ele voltava para sua caminhada após fazer aquele comentário.

Foram 3 segundos onde meu cérebro congelou, talvez pela informação desconexa, ou mesmo pela língua, já que ele falava em um espanhol bem diferente do que eu estava acostumado.

3 passadas a frente, enquanto eu me encontrava parado e desnorteado, ele parou novamente e olhou para trás e disse um nome.

Como uma assinatura de um bilhete.

Virou se e voltou para sua caminhada, dessa vez em definitivo.

E eu fiquei ali em uma crise de choro sem precedente.

O Camino, mexe com você.

Mexe com sua energia, com seus pensamentos, com seu futuro.

Ele cobra de você um pedágio de energia, mas vai fundo e molda sua alma.

E naquele momento, um senhor, desconhecido, com um sorriso que não me era estranho, fazia do meu caminho, algo ainda mais importante.

Sem crenças ou aprofundamentos em espiritualidade, um desconhecido me dizia que aquela minha amiga de uma vida inteira, ainda estava ali do meu lado como uma protetora que sempre foi.

Mesmo 20 anos depois, aquele sorriso do senhor tinha uma semelhança com algo que eu jamais esqueceria.

Aquela cara de lua, olhos arredondados e sorriso largo e que transmitia tanta paz.

De alguma forma, aquele sorriso se materializou ali, no momento daquele bilhete que não era esperado.

Eu tive alguns anos de afastamento das memórias dela.

Talvez por revolta.

Tenho fases onde a perda me cria uma certa indignação.

Essa minha rebeldia de espírito me traz esses conflitos.

Mas depois desse dia, minhas memórias dela voltaram perfeitas a minha cabeça.

E vejo seu sorriso intacto na minha mente e isso me traz toda a paz que eu preciso.

Ela sempre foi minha companheira.

Minha amiga que sempre lutou pelo melhor de mim.

Hoje o dia não é dos melhores.

Eu tenho a sensação de que falhei com ela falhando com alguém.

Passei a tarde febril, olhando um dia lindo de sol pela janela.


De fundo, aquela música triste que ela amava “The reason”, e que fazia um sentido absurdo nesse momento de hoje.

Às vezes tenho o sentimento que estou cansado dessa caminhada.

Que eu podia apenas descansar e encontrar ela com aquele sorriso novamente.

Mas logo me vem aquela sensação de que ela esta reprovando esse meu sentimento.

Então tento levantar a cabeça.

Tenho pessoas a minha volta especiais pelas quais vale continuar caminhando.

O caminho esta la para ser feito e ter alguém do seu lado apoiando é um diferencial.

Ela nunca deixou eu desistir de nada, desde os meus amores de adolescente.

Sempre foi do discurso de que se me fazia bem, se me melhorava como pessoa e tinha que brigar por aquilo.

Então eu não ia decepcioná-la.

Minha vida parecia um quebra cabeça com milhares de peças minúsculas.

Mas eu não ia desistir de montar.

Eu sempre fui muito verdadeiro, mesmo quando falhava.

Jamais tentava ser quem eu não era.

Sempre admiti minhas falhas, meus erros e isso aprendi com ela.

Hoje era um dia que queria ela do meu lado, para chorar no seu colo.

Ela sempre foi a melhor para cuidar de mim quando eu estava despedaçado.

Sempre me ajudou a juntar os cacos e ser alguém melhor depois de toda a dor.

Eu sou falho para caralho.

E mesmo que lute para diminuir os erros, ainda assim quando acontecem, isso me destrói.

Principalmente se machuca outra pessoa.

Mais eu prometo por mim e por ela que a cada dia, vou tentar ser uma pessoa melhor.

Que vou ser o porto seguro que você precisa e merece.

Sempre a minha versão do dia seguinte vai ser melhor.

Mais madura, mais empática e mais feliz.

Só de eu não me sentir mais sozinho, já mostra a diferença que você faz na minha vida.

Mas vou continuar caminhando e deixar que o caminho me traga as respostas deste questionamento sem fim.

domingo, 9 de fevereiro de 2025

Apenas um passo ao longo de um caminho


 

Só se vive uma vez?

Não sei mais 

É engraçado ver como o tempo te muda.

Te transforma e te molda.

Não necessariamente só positivamente, como negativamente.

A maturidade nem sempre é essa benção que as pessoas acham.

Com ela, pode se perder a empatia e até mesmo a humanidade.

Parece que vejo isso ocorrendo a todo momento.

Isso não deveria me afetar.

Pelo menos ao que consta nos registros, sou um vigarista, um con man, como preferir.

Essa sempre foi minha fama.

Minha fase nômade parece ser só mais uma pequena parte do plano e das mudanças do personagem.

Prometo o que não tenho, na esperança de entregar algo ou te fazer acreditar que você recebeu o que foi prometido.

Sempre tive o dom de criar aquela aura no ar que faz você achar que esta sonhando.

Retorica perfeita.

Ar tristonho quando necessário, sorriso esperançoso e leve para te incentivar pular do penhasco.

Um salto de fé talvez?

É fácil distinguir quem tem o controle das coisas.

O malandro e o otário.

O parasita e o parasitado.

Manipulador e manipulado.

Sei a hora de avançar e a hora de recuar.

Como um jogo de xadrez, aprendi a ter uma paciência invejável.

Raramente a rainha vai tremer e perceber algo, até que o rei tenha caído de vez.

Às vezes sento na minha poltrona de deus e apenas assisto.

Não me entenda mal, o tipo de deus que narro aqui não tem nada a ver com a sua pomba branca da paz e toda aquela luz.

Digo algo mais mundano, que sorri com falhas e aprende.

Fico assistindo aos seus passos completamente equivocados.

Quando todo mundo a sua volta já percebeu seus erros.

Só você que não.

E aí fica difícil não se aproveitar, é da natureza humana.

Onde alguém fracassa, alguém ganha.

Quando alguém demonstra fraqueza, sempre alguém se fortalece.

Absurdo?

Não fiz as regras.

Mas é bom reavaliar sempre seus passos.

Suas crenças e suas motivações.

Seguir regras nunca foi minha praia.

Sou mais de me alimentar de momentos.

O combustível do próximo passo é sempre o que me move no presente.

Tenho fases de planejamento e outras que o não planejar é o que faz meu barco velejar.

Já entendi esse padrão.

As pessoas vão chegando, outras vão indo embora e assim vou procurando um equilíbrio que faça sentido.

Não existe muito sentido em se deixar destruir sua vida por erro de lógica.

Existindo milhões de erros la fora que fará você sorrir no final mesmo dando tudo errado.

Mas assim como sua mente é quem controla o necessário para te ajudar nesse pequeno passo que vai te trazer de volta a caminhada, e ela que vai te congelar.

Não importa quantos quilômetros você precisa caminhar, o que importa é cada passo a ser dado.

Um de cada vez.

Não se deixe enganar com minhas doces palavras ou sorriso charmoso.

Eu não posso te ajudar a caminhar, mesmo que eu prometa isso a você.

Sua caminhada quem faz é você.

Eu sempre lia em voz alta meus textos em casa, pelo menos uma vez após pronto.

Filé de peixe, minha gata, me olhava com aquele olhar de quem entendia tudo que eu falava.


Essa tinha aprendido a ser uma vigarista das mais experientes.

Me manipulava desde sempre e era só sucesso nas suas investidas.

Mas mesmo o mais esperto dos vigarista, pode ser enganado.

E ela ouvia aquelas palavras e parecia entender cada ponto.

La estava ela na mesma poltrona de deus que eu me coloco às vezes.

Analisando, errando, aprendendo para usar nos próximos passos.

Fim de tarde com um banjo tocando de fundo e um por do sol que me incentivava a continuar caminhando.

Minha cerveja gelada descia como um conto perfeito, enquanto minha gata no colo ronronava e me deixava naquele clima de paz, que só um enganado pode sentir.

Um dia da caça, outro do caçador.