Era final do verão, mas ainda restavam
alguns dias ensolarados.
Eu estava realmente aproveitando aquele clima quente.
Acordava todos os dias de bom humor.
O que poderia ser considerado um sinal do apocalipse.
Ia andar pela cidade com uma sensação de leveza.
Seguia um mantra nesses belos dias de verão.
Levantava logo cedo, caminhava beirando o rio por algum tempo, ouvindo algo como Tchaikovsky
no fone de ouvido.
Ia almoçar com Ari e John e de lá parávamos em algum pub com área aberta para o sol.
Dali ficávamos até que o sol se fosse embora.
O que no verão da Irlanda significa as 23 mais ou menos.
Dependendo da disposição do dia, às vezes entrávamos para a parte fechada do pub e fechávamos o estabelecimento no meio daquelas pessoas felizes.
Tudo graças aos raios de sol.
Aqueles tempos difíceis de meses atrás pareciam nunca ter existido.
Os restos dos muros que desabaram já não mais doía de ser ver como antes.
Viraram uma espécie de memorial de uma fase bem pesada da vida.
Que sabe se lá como, eu consegui sobreviver.
Até mesmo a tragédia te traz algo.
Raramente você vai ver.
Mas se você conseguir perceber, com certeza é uma lição importante que você terá absorvido.
Nesse momento não tenho um amor.
Nesse momento não tenho nenhuma relação completamente desequilibrada para me deixar distraído.
Nem todo álcool que ando consumindo ou mesmo as insanidades das minhas noites de verão tem conseguido me deixar entorpecido.
Estou sentado na grama de um parque, aproveitando o bem-estar que o calor do sol me traz.
Sem nenhuma neblina nas minhas vistas.
Sem nenhuma escuridão na minha mente.
Sem nenhum aperto no coração.
Momentos como esses são únicos.
Mas são passageiros e terminam em um estalar de dedos.
Mas mesmo que por minutos, é bom sentir um pouco de esperança real.
Vê que até mesmo no mais fundo do fundo do poço, um raio de sol pode aparecer.
Um corvo aterrissa do meu lado, vindo de um voo majestoso.
Aquelas penas negras enormes e brilhosas que com a união da luz do sol parecem produzir faíscas.
Ele simplesmente fica ali do meu lado, dando seus pequenos passos e me encarando com aquele olhar profundo.
Isso parece que me dá um tempo extra de bons pensamentos.
Ele consegue entrar na minha alma.
Pela primeira vez em muito tempo me sinto aliviado e sem sentir as dores que o passado deixou.
A um misticismo sobre o corvo, algo relacionado a mau agouro.
Isso nunca me afetou.
O sentimento que ele me passa é liberdade.
O último instante antes do seu novo voo, ele dá dois passos à frente em minha direção.
Ainda com seu encarar.
Dá duas bicadas no chão, abrindo suas enormes asas e se vai.
Naquele novo voo em direção ao sol.
Aquela conexão louca que tive ali me trouxe uma paz que não conseguiria mensurar.
Eu não sou um otimista.
Nunca fui.
Mas olhar para trás para ver pelo que passou.
Pelo que sobreviveu.
Por todas as porradas que você aguentou.
E por todas as lágrimas que você deixou cair.
Às vezes, isso é algo que traz o conforto que você precisa para continuar.
É isso.
Mais um dia.
Mais porrada para se esquivar.
E com isso,
Mais vitórias para empilhar.
Se quiser desistir, faça.
Só não diga por aí que foi comigo que aprendeu essa atitude.
O que eu procuro e passo para a frente é a procura de uma nova fase na vida.
Com menos dor e menos miséria.
Melancólico sem se deixar abater! Gostei
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